segunda-feira, abril 28, 2008

O Estojo (16)

Colégio Feminino 14 – Mais um Ano de Deboche. Filme exclusivamente com raparigas. Joaquim recordou o fiasco e engoliu em seco. Não, decididamente, não podia voltar a cometer erros, repetiu mais uma vez para si, enquanto continuava a caminhar de um lado para outro, no quarto.
Deteve-se em frente ao espelho que tinham por cima da cómoda e este devolveu-lhe um rosto sério, macilento e com olheiras. Desviou o olhar para a larga tira de renda que cobria a parte central do móvel e caía para os lados, até meio. Tinha vindo no enxoval de Deolinda, feita por Jesuína “com muito amor e carinho, a pensar num dia feliz como este”.

Em cima da renda estava uma pequena caixa de jóias em madeira. Abriu-a. Estava vazia. Abriu depois a primeira gaveta. Para além da roupa interior da mulher – também ela vinda no enxoval – encontrou lá as duas embalagens de perfume que lhe tinha oferecido no último ano. Abriu as caixas. Os frascos estavam cheios. Cheirou ambos. Na opinião dele, eram fragrâncias agradáveis.
Quando os olhos regressaram ao espelho, uma ideia começava a tomar forma no seu espírito. O rosto tinha-se animado.
Pegou no casaco e na carteira e saiu de casa.

A loja estava profusamente iluminada. No ar, sentia-se um aroma doce. Eram vários os expositores e muita e variada a oferta disponível. Uma batida electrónica descia da instalação sonora. Desorientado com a súbita sensação de dejá vu, Joaquim deu dois passos e parou, tentando concentrar-se. Teve que fazer um esforço para se lembrar do que estava ali a fazer.


– Boa tarde. Posso ajudá-lo? – uma rapariga morena, alta, magra, muito bem maquilhada e a cheirar a flores, sorria-lhe o sorriso mais resplandecente que ele alguma vez tinha visto.
– Er… pode, sim… eu, como é que lhe consigo explicar isto?! A minha mulher, ela… não é muito dada a estas coisas… – a vendedora da perfumaria mantinha o sorriso jovial e acenava ligeiramente com a cabeça, como se soubesse exactamente o que ele queria dizer, o que o tranquilizou. – Você sabe. Eu queria… vocês não têm à venda, tipo, um kit de beleza, com um pouco de tudo. Ela nunca usa e está a precisar.

A rapariga não conteve o riso e pediu para a acompanhar. Dirigiram-se ao expositor dos estojos de maquilhagem, onde se demoraram.

* * *

Deolinda engravidou pouco depois. O rapaz, Afonso Prazeres Aleluia, foi a alegria de todos mas, logo a seguir ao seu primeiro aniversário, Joaquim convenceu-se que havia algo irremediavelmente danificado na relação, algo que ele jamais conseguiria reparar – algo que ele, percebeu sem qualquer margem de dúvida, já não queria sequer tentar reparar. Deolinda escutou uma longa explicação do marido sobre as razões que o levavam a pedir-lhe o divórcio, sem qualquer emoção visível. No final, limitou-se a encolher os ombros e a dizer “está bem, mas fico eu com o miúdo”.
Joaquim não voltou a casar. Vive actualmente em união de facto com uma colega de trabalho e tem uma filha dessa relação. Era suposto ele ficar com Afonso aos fins-de-semana, mas o rapaz dá noites más, chora muito – a avó Jesuína diz serem pesadelos causados pela separação dos pais – e, com a desculpa de não perturbar a irmã, passa quase todo o tempo em casa dos avós paternos.
Joaquim diz que é feliz.
Deolinda vive para o filho. Afirma com convicção não querer saber de mais homem nenhum. É mãe extremosa e ajuda os pais na loja enquanto o filho está na creche.
Nunca chegou a abrir o estojo de maquilhagem.

FIM

boomp3.com

quinta-feira, abril 24, 2008

O Estojo (15)

Não foi fácil a Joaquim explicar a compra do lubrificante.


– Às vezes pode dar jeito, tu sabes.
– Não, não sei.
– O senhor disse que facilitava, que é natural…
– Tu andas a falar da nossa vida com outras pessoas, Quim?
– Na, na, eu não! Falou-se nisso, mas genericamente... da… do… de não ser fácil, às vezes… tu… eu… – com o dedo indicador a apontar, parecia seguir o voo errante de um qualquer insecto invisível. Depois de um breve silêncio, baixou o braço e os olhos. – Eu não falei com ninguém. Comprei isso porque estava em promoção e… pareceu-me uma boa ideia. Tu sabes que às vezes… não foi por mal.

Deolinda hesitou sobre a reacção a ter. Se por um lado se sentia, de alguma maneira, diminuída por aquilo, por outro, não deixou de achar que podia ser, de facto, útil. Foi sentar-se no sofá e colocou debaixo de cada braço, na vertical, uma almofada. Soprou o cabelo da franja. No olhar, já mal se distinguiam dois pequenos pontos luminosos.


– Põe lá isso a andar.

Joaquim apagou as luzes e colocou o DVD no leitor. Uma luz esverdeada tomou conta do ecrã do televisor, iluminando um rosto sorridente e duro como pedra. Foi sentar-se ao lado da mulher e tentou em vão tirar a almofada que os separava. Resignado, apontou o comando.


– Como é que isto se chama?
– Boa pergunta. Nem vi. Eu posso…
– Deixa estar, não interessa.

Depois de um breve genérico, surgiu em grande plano uma mangueira que a câmera acompanhou até um aspersor que estava desligado. O plano abriu, revelando um relvado e uma estrada de cascalho, que terminava junto à escadaria dum edifício com ar antigo e pesado. Um carro deteve-se junto dos degraus e dele saiu uma rapariga loura, apertando contra si um dossier. Joaquim reconheceu-lhe o uniforme e tossiu. A estudante subiu as escadas e entrou.
A câmera fez então o movimento inverso, terminando no aspersor que, desta vez, projectava grandes golfadas de água em todas as direcções.

Sala de aula. Seis estudantes – uniformizadas na roupa e no físico – escutavam a directora – ar severo, no seu saia-casaco preto e saltos altos. Escola em regime de internato. Primeiro dia de aulas. Sessão de boas vindas, incluindo conjunto de regras – duras – a cumprir. Penalidades para quem prevaricar. Trocam-se olhares. Línguas humedecem lábios. Pernas cruzam-se e descruzam-se como se fosse uma aula de dança.
Sente-se ansiedade na sala. Joaquim mexe-se no sofá. Coloca um braço nas costas do sofá, atrás da mulher.
Quarto. Duas raparigas partilham o exíguo espaço. Apresentam-se. Concordam no ar ameaçador da directora. Uma queixa-se do calor e despe-se. Vai tomar banho. Banho demorado, em que nenhum milímetro de pele é descurado. A colega, na cama, lê um livro. Está nua. “Queres ajudar-me com o top”? Trocam-se elogios à beleza e ao corpo fantástico. Carícias. Beijos. Sexo.


– Passa isso para a frente, Quim.

Fast Forward.

Corredor. Directora bate à porta. Aluna abre. Esqueceu-se de um livro na sala de aula. “Obrigado. Já agora, entre”. Trocam-se elogios à beleza e ao corpo fantástico. Carícias. Beijos. Sexo.


– Passa isso para a frente, Quim.

Fast Forward.

Ginásio. Duas alunas atiram uma bola de basquete uma à outra. Risos histéricos. Comentários sobre mais um ano lectivo que começa. Balneário. Banho. Trocam-se elogios à beleza e ao corpo fantástico. Carícias. Beijos. Sexo.


– Já sei – e Joaquim passou o filme para a frente.
– Onde é que estão os homens, Quim?

(continua)

boomp3.com

terça-feira, abril 22, 2008

O Estojo (14)

– Eu não queria comprar aquilo. A sério… estava só a ver… quer dizer, não estava… eu estava… foi sem querer… – Joaquim sentia fios de suor a escorrem-lhe pelas costas. Tinha tirado o boné e o casaco: precisava dissipar o lume em que se sentia arder. Com os olhos baços, o empregado da sex-shop olhava para ele, mas Joaquim duvidava que o estivesse a ver, quanto mais a ouvir. Ainda assim, continuou a explicar-se: – Não sou desses, hã?! Não vê o filme que eu vou levar? Naaaaa, eu cá não sou desses. Aquilo… foi… uma brincadeira… er…

Com um movimento maquinal, o empregado rodou lentamente a cabeça para o televisor e deixou-a cair para a frente. Pouco a pouco, como se se tornasse subitamente pesado, o queixo descaiu-lhe. Raios laser e naves espaciais reflectiram-se nos seus olhos cinzentos.


– Gosto da sua gravata. A minha mulher comprou-me uma parecida, no Natal… foi a minha sogra, mas isso… sabe, a minha mulher, ela… ela é assim, pronto – Joaquim andava com o fecho do casaco para cima e para baixo. – Eu não a culpo de nada… ela não tem culpa de nada. Continua a mesma Deolinda de sempre… sabe, eu já a conheci assim… por isso… – encolheu os ombros – é metida consigo, está a ver?! Um bocadito alheada do resto, daquilo que está para além do alcance do braço… mas eu apaixon… eu gostei dela assim, fazer o quê?! Talvez tenha achado que a conseguia mudar… – o fecho encravou e Joaquim começou a batucar com as pontas dos dedos no balcão; o olhar preso no movimento ritmado da mão. – Vou levar este filme para ver se… é que… eu acho que sim… que é uma coisa importante na vida de um casal… acho que sim… – ficou algum tempo em silêncio. OFleur d’Amour… se é afrodisíaco, eu levo. E aquilo ali, aquelas embalagens em promoção? – apontou para um expositor na outra extremidade do balcão. O empregado soltou um grunhido que Joaquim não decifrou: – Lubi quê?

O barulho da percussão digital foi abafado por uma gigantesca nave que, na televisão, desafiava as leis da física, rugindo ferozmente enquanto cruzava a imensidão de vácuo galáctico, em direcção a uma longínqua bola cor de laranja. Quando se preparava para aterrar numa pantanosa cratera, Joaquim voltou a falar: – Sabe uma coisa? Se calhar, quem tem de mudar sou eu. É isso mesmo! Vai na volta, é mais um problema meu que dela – parou com o batuque e sorriu um sorriso natural. – Isto aqui é o quê?

Os artigos foram registados, colocados dentro de um saco e o troco feito sem que o empregado tivesse descolado o olhar do televisor. Dois monstros peganhentos e cabeludos, lutavam impiedosamente. Joaquim, por seu lado, estava animado e satisfeito com as compras. Enquanto vestia o casaco e colocava o boné, afirmou:


– O senhor é um bom ouvinte, sabe. Nem todas as pessoas que estão a atender outras têm essa capacidade. Há por aí muita falta de pachorra. Muita cera no ouvido. Gostei verdadeiramente de o conhecer. Então, boa noite – quando já estava perto da porta, voltou para trás. – E não posso deixar de lhe agradecer os conselhos que me deu. Muito obrigado. Acho mesmo que é mais um problema meu que outra coisa. Que me está a escapar algo… – tomou a direcção da porta e parou. Hesitou durante uns segundos e regressou de novo ao balcão. – Já agora, uma pergunta. Em vez de desenhos animados, você não devia estar a ver filmes de… – fechou o punho e deu uns quantos socos tímidos no ar – você sabe…

O empregado levantou a cabeça e olhou para Joaquim como se ele fosse louco.

(continua)

boomp3.com

segunda-feira, abril 21, 2008

O Estojo (13)

Enquanto Deolinda abria a janela da sala, Joaquim foi para a cozinha preparar o jantar. Retirou vários recipientes cobertos com película aderente do frigorífico, abriu a garrafa de vinho – sem acidentes de maior – e passou a travessa Cozinha Velha por água. Depois, separou os pedaços de frango: de um lado, as asas e as pernas (para ela), do outro, o peito (para ele) e levou tudo para a sala. Não deixou que ela se servisse:


– Eu sirvo-te, querida – com um pano de cozinha no ombro e o mais cerimoniosamente que conseguiu, colocou com um garfo, uma asa, uma perna e três rodelas de tomate, num prato. Seguidamente, abriu o pacote de batatas fritas Pála Pála e colocou uma mão-cheia no prato, que passou à mulher. Encheu o copo dela de vinho e repetiu a operação para si próprio, não vendo a careta que Deolinda fez quando, como o dedo, percebeu que a temperatura se tinha escapado por completo da ave. Mordeu o lábio inferior e nada disse.
Não tocaram nos patês nem no pão e nada disseram até só haver ossos nos pratos.


– Gostei de ter dançado… – sem olhar para o marido, Deolinda ia empurrando um osso de frango, com a faca. Joaquim ficou sem reacção. Muito sério, contemplou o osso a rebolar de um lado para o outro no prato da mulher. Depois de uns segundos de silêncio, levantou-se e recolheu os pratos sujos.
– E agora, temos uma sobremesa que é um mimo – afirmou, indo para a cozinha. Regressou com uma taça de mousse e um tupperware cheio de morangos. – Funciona assim, metes o morango na mousse e comes. É um manjar dos deuses.
– O chocolate faz-me borbulhas. Sabes isso.
– Oh, só um bocadinho não pode fazer mal – e encheu os copos com mais vinho.

Enquanto Joaquim levantou a mesa, Deolinda foi conferir o estado do seu espelho de água caseiro. Confirmou as suas piores suspeitas: a água estava turva, cheia de cinza do incenso. Rangia os dentes quando o marido voltou à sala e se dirigiu ao móvel das bebidas. Colocou-se de cócoras e depois, como que accionado por uma mola, ergueu-se com um salto. Tinha na mão um saco e na boca um sorriso dos tais.


– Nem penses – atirou-lhe ela, bruscamente, ao mesmo tempo que saía da sala.
– Hã?
– Estou cheia e ainda quero ver as notícias. E bem podes ir pondo a novela a gravar…
– Vais onde, querida?
– Dar de comer aos peixes e depois à casa de banho, posso?

Programou o gravador, colocou a loiça na máquina, varreu o chão da cozinha e foi por o lixo à rua. Quando Joaquim regressou a casa, deu com Deolinda no meio da sala, hirta e muito vermelha, com uma embalagem na mão. No chão, a seus pés, jazia o saco das compras.


– O que é isto, Quim? – leu o rótulo em voz alta: – Wet n’ Wild, wine grape, sugar free, non staining, flavoured lubricant… – permaneceu quieta, lívida e com a boca escancarada. No olhar, ardia-lhe uma fogueira imensa.

(continua)

boomp3.com

sábado, abril 19, 2008

O Estojo (12)

Joaquim veio esperar a mulher à rua.
– Anda, vamos os dois à churrascaria – disse ele, pegando-lhe na mão.
– Já? Não é cedo?
– Não. Há certas coisas que se querem feitas com calma – Deolinda ia lançar-lhe uma farpa, mas susteve a respiração. Com voz pausada, disse:

– Não podes ir comprar o frango sozinho? Estou cansada.
– Cansada? – Joaquim engoliu em seco. – Isso quer dizer que… – foi incapaz de concluir.
– Não tão cansada assim, não te preocupes.
– Ah… ah… boa… ainda bem.
– Vai lá tu ao frango. Quero ir por os pés de molho e rapar os pêlos das pernas.
– Não podes ir para casa, temos que chegar juntos. Preparei umas coisinhas…

À medida que se aproximavam de casa, o sorriso de Joaquim era cada vez mais evidente, comprimindo-lhe as maçãs do rosto contra os olhos. Deolinda sentia-lhe os nervos na mão esquerda, aquela que ele teimava em não largar. Quando entraram no prédio, não se conteve:


– Agora já chega – soltou-se e sacudiu a mão, que estava escura.

Subiram as escadas em silêncio. No último degrau, Joaquim parou e encarou a mulher:


– Tens que ficar aqui um bocado – ela franziu a testa. – Quero que esteja tudo perfeito, quando entrares – ela ia falar, mas Joaquim colocou-lhe o dedo indicador direito nos lábios. – Por favor.

Deixou a porta encostada, enfiou o saco com o frango no forno e levou para a sala o pão e a salada de tomate, que colocou na mesa. Acendeu as velas e o incenso. De volta à cozinha, retirou a garrafa de Raposeira do frigorífico e começo a abri-la, quando a voz de Deolinda se fez ouvir:


– O frango está a arrefecer, Quim – tinha-se aproximado da porta e tentava espreitar pela fresta. – Tu sabes que eu não gosto do frango frio.
– Já vai… – tinha a garrafa presa entre as pernas e puxava pela rolha, que teimava em não sair. – Que porra...
– Que pivete é este?
– É do Fleur
– gritou da cozinha. Vá lá, pá… caraças… abre! Mãezinha do céu…
– O que é que estás a fazer, Quim? – estava agora com a cabeça encostada à porta, tentando enfiar o olhar pela minúscula abertura.
Por fim, com os dentes, Joaquim conseguiu retirar a rolha.


– Fosgasse!... Copos... copos, isto devia beber-se naqueles… bem me tinha que esquecer de alguma coisa… – foi ao móvel da sala, pegou em dois copos long drink e colocou o cd a tocar. Uma voz grave e profunda, encheu o pequeno apartamento.

“I've heard people say that too much of anything

Is not good for you baby

But I don't know about that

As many times as we've loved

Shared love and made love

It doesn't seem to me like it's enough

It's just not enough”


– Quem é que está aí contigo? Que barulheira é esta? – Joaquim apareceu à porta, sorriso rasgado. Estendeu um copo à mulher:
– A uma noite inesquecível.
– Olha os vizinhos… – e entraram. – Isto é o quê? – perguntou ela com o nariz enfiado no copo.
– Espumante.
– Tu sabes que eu não aprecio coisas com gás. Nunca me viste beber Sumol. Faz-me azia….
– Uma vez não pode fazer mal – ele estendeu o copo para um brinde, mas Deolinda já tinha despejado o seu copo, de um trago.
– O frango já deve estar frio. E esta música…
– Anda, vamos para a sala – num movimento rápido, Joaquim pegou na mão da mulher e fê-la rodar, ficando os dois apertados um contra o outro. – Nunca dançámos.
– Por uma boa razão, eu não…
– Só precisas de me seguir.
– Olha lá, este cheirete não vai ficar entranhado nas cortinas?

(continua)

boomp3.com

quinta-feira, abril 17, 2008

O Estojo (11)

Não, decididamente, não podia voltar a cometer erros, repetia Joaquim para si mesmo, relembrando os acontecimentos funestos do dia em que viram o filme.
Surpreendentemente, Deolinda até aceitou bem a sugestão. A princípio, mostrou-se chocada, depois, considerou a ideia sem jeito, terminando por ceder, com o argumento que se ele achava que ajudava a relação, estava disposta a fazer o sacrifício – sem confessar que tinha sentido uma desinquietante curiosidade em saber como reagiria ela a outros homens nus; “quem sabe se, imaginando-os”… Marcaram para daí a quatro dias, sábado.
Sem nada dizer à mulher, Joaquim tratou de tornar o dia especial. A ideia de ser só o filme pelo filme, causava-lhe desconforto. Decidiu elaborar “um plano mais vasto”: pediu à mãe parte do serviço Vista Alegre, os talheres Cutipol e um candelabro; comprou velas aromáticas, uma garrafa de vinho tinto – em que gastou quase sete euros – e outra de Raposeira, para aperitivo; aconselhou-se com o amigo Tavares – mais experiente nas coisas do romantismo –, sobre a música ambiente, a entrada e a sobremesa.

Chegado o dia, Deolinda foi almoçar a casa dos pais e Joaquim para a cozinha: retirou os patês La Piara das embalagens e colocou-os num prato (“mais chique”, nas palavras do amigo); fez uma salada de tomate; preparou a mousse de chocolate, certificando-se que a quantidade de água estava absolutamente como dizia no pacote (“parte umas nozes e põe por cima, tem mais pinta”); lavou os morangos, com que iriam acompanhar a mousse e partiu-os aos quartos (“uma sobremesa que é um sainete”); colocou o vinho e o espumante no frigorífico; pôs a mesa na sala; colocou o cd emprestado de Barry White a jeito (“elas ficam passadas com a voz do gajo”); as velas no candelabro, certificou-se que tinha fósforos e partiu pão. Dirigiu-se depois ao móvel da sala onde guardava algumas bebidas alcoólicas para oferecer às visitas – todas por abrir – e, de detrás delas, puxou o saco de plástico onde guardava as compras que fez na sex-shop. Retirou um dos três objectos e voltou a guardar o saco. Sorriu quando leu a embalagem: Fleur d’Amour – Incenso Afrodisíaco.


– Oh diabo, então isto é em palitos? Onde é que eu agora vou espetar isto?! – interrogou-se, coçando a cabeça. Acabou por colocar dois paus de incenso na pequena sereia que tinham na sala.

Tinha sido o presente de casamento dos avós: uma coluna com quase um metro e meio, encimada por uma jovem sereia em loiça que, posta em sossego num rochedo, entornava um cântaro. Enchido o depósito e ligada a electricidade, um motor punha a água a circular, fazendo-a cair do cântaro para uns degraus, terminando num pequeno charco, no qual a rapariga perdia o olhar.
Agora, para além do recipiente, a sereia amparava em cada braço uma espécie de lanças do amor.

(continua)

boomp3.com

terça-feira, abril 15, 2008

O Estojo (10)

Considerou a altura péssima para se lembrar de tal coisa: talvez tivesse sido boa ideia perguntar primeiro a Deolinda se queria ver um filme pornográfico com ele. Fitou a porta, depois o empregado – que se mantinha em transe – e considerou sair da loja a correr.


– Disparate. Levas o filme, escondes bem escondido e fazes-lhe a conversa – disse ele, como se estivesse a falar com alguém. – Passas-lhe a mão pelo pêlo, amansas… a fera…

Tirou da prateleira uma caixa com a foto de uma rapariga que fazia um trejeito com a boca, como se estivesse muito, muito zangada. Vestia cabedal e brandia um chicote, enquanto espezinhava com os stilettos o que parecia um corpo masculino, gordo e peludo, metido dentro de umas cuecas de látex e com uma máscara a cobrir-lhe a cabeça. Chun-Li A Fera Asiática, leu ele em voz alta. Com as mãos a tremer, quase deixava cair a caixa quando a devolveu ao expositor. Olhou em redor. Tudo se mantinha calmo. E foi então que umas quantas raparigas loiras lhe sorriram.
Aparentavam ser muito novas, felizes e moderadas no uso de roupa – envergavam mini fardas colegiais, em cores garridas. A vida, seguramente, corria-lhes bem e Joaquim devolveu-lhes o sorriso. Pegou no dvd. Estava decidido, ia aquele.
Naquele momento, uma descarga de adrenalina percorreu-lhe o corpo e ele estremeceu. Depois, sentiu-se aliviado e até um pouco eufórico. Afinal, não tinha sido assim tão difícil. Estava confiante, até, algo que já tinha esquecido como era sentir. “As coisas que uma sex-shop fazem a uma pessoa”. Espantou-se.

Dirigiu-se ao balcão, onde o empregado se mantinha impávido, mas não sereno a olhar para o ecran – parecia ter sido mumificado naquela posição, com a cabeça pendurada para a frente e a boca ligeiramente aberta; havia nele algo que perturbava. Joaquim alterou a trajectória para conseguir ver o que provocava aquele estado catatónico. Dirigiu-se a um outro expositor, onde fingiu estar a observar algo, mas apenas imaginava cenas depravadas. Discretamente, levou o olhar até ao balcão. Para sua surpresa, tratava-se apenas de um filme de banda desenhada.
Foi nessa altura que a cabeça do empregado rodou no nó da gravata e o olhar dos dois se cruzou. Como se tivesse sido apanhado em falta, Joaquim virou-se rapidamente para a frente e soltou um grito, horrorizado: sem dar conta, tinha pegado num artigo exposto. Muito vermelho e com a face a arder-lhe, deu por si com um comprido e rugoso pénis a baloiçar-lhe na mão.

(continua)


boomp3.com

sexta-feira, abril 11, 2008

O Estojo (9)

Deitou-se na cama a matutar sobre o que poderia ele ainda fazer pela relação. Sentia que, a cada dia que passava, eram menos as coisas que tinham para partilhar. Já pouco conversavam e, ultimamente, achava até que ela evitava olhar para ele. Levantou-se de um pulo.
Espantou os maus pensamentos andando de um lado para o outro, no quarto. Tinha de se concentrar, precisava urgentemente de uma boa ideia. Não podia precipitar-se como da última vez em que tinha tentado introduzir algo novo na relação:


– Tavares, pá… como é que eu – Joaquim sorria o sorriso dos nervos. – Pá… precisava que tu… tu deves ter…
– Depois de tantos anos, ainda tens que te engasgar comigo?

Estava convencido que o problema do seu casamento passava, em grande medida, por falta de sexo… e por total ausência de sexo com um mínimo de qualidade. Achou que uns filmes pornográficos os ajudariam: a ela, que era sempre distante e fria… e parada – embora nunca tenha sido capaz de lhe dizer tal – e a ele também, tão incapaz de saber o que fazer, tão monótono, tão despachado. A ideia surgiu-lhe quando leu uma reportagem sobre um Zoo na China onde, para aumentar a taxa de natalidade dos Pandas, lhes mostravam imagens de outros Pandas a ter relações.
Tavares, o seu melhor amigo, não tinha filmes pornográficos para emprestar, mas tinha uma sugestão:


– Alugas.
– Não sou membro de nenhum clube.
– Tornas-te.
– Hmmmmm…
– Já sei! Compras.
– Onde?

Tavares conhecia uma sex-shop na Baixa, mas Joaquim achou isso “muito perto”.


– Bom, há uma onde eu moro.
– Isso! Talvez…

Nunca tinha ido à Quinta do Infantado mas, com as indicações precisas do amigo, depressa achou A Loja do Mestre André Sex Shop. Estacionou à porta e deixou-se ficar no carro, a observar tudo à sua volta. Era hora de jantar e, quinze minutos depois, ninguém tinha entrado ou saído da loja, nem sequer passado por ali a pé.
Uma boneca insuflável, descaída sobre a perna esquerda, como se fosse coxa, estava a meio da montra, iluminada por uma luz vermelha. Joaquim imaginou-se a soprar-lhe no pipo e fez uma careta. Diversa parafernália sexual completava a decoração da montra. “Tudo coisas desconhecidas”, concluiu ele.
Levantou as golas do casaco, enterrou um boné até às orelhas e entrou, a olhar para o chão. Um expositor pequeno mas alto, repleto de caixas de dvd, estava junto da entrada e Joaquim colocou-se atrás dele. Dali podia ver sem ser visto.
Para além dele, apenas um empregado estava presente. Vestia fato e gravata – o que lhe causou estranheza a Joaquim – e parecia não ter dado pela sua entrada, curvado que estava na direcção de um pequeno ecran colocado no balcão. Parecia hipnotizado pelo que via.
Joaquim olhou em redor. Admirou-se com o facto da loja estar bem iluminada. Tinha imaginado uma coisa escura, peganhenta, com criaturas andrajosas a vaguear por corredores apertados e bafientos, mulheres desdentadas e de peles caídas a puxá-lo pela roupa para dentro de quartos que nunca se atreveu a imaginar. Em vez disso, deu por si num espaço amplo e fluorescente, onde se sentia no ar, aquilo que lhe pareceu ser um ligeiro odor a baunilha. Surpreendido, estava numa espécie de minimercado, onde a diferença residia apenas nos produtos expostos.

(continua)

boomp3.com

quarta-feira, abril 09, 2008

O Estojo (8)

Joaquim tinha proposto que a Lua-de-mel fosse no Hotel Costa da Caparica.


– É quatro estrelas. Tem piscina. Vistas desafogadas. – disse ele, com voz viva e olhar arregalado. – Fica perto de casa… – acrescentou, com voz mortiça e a olhar para os sapatos.

Deolinda não se impressionou:


– Não quero ir para um sítio onde possa encontrar gente conhecida – não explicou, mas a vizinha Celeste tinha um avançado no Parque de Campismo da Praia da Saúde.

Também não tinha sido fácil a Joaquim, conhecer Deolinda. Chegaram um ao outro pela internet, numa sala de chat.
Desesperado com relações inconsequentes, Joaquim decidiu procurar no virtual o que lhe escapava no mundo real. Já Deolinda, procurava no sítio da TVI novidades sobre telenovelas, quando – e ainda hoje se interroga amiúde porque o fez – decidiu entrar na sala chat, acabando por se entusiasmar com a anonimidade da coisa, com a possibilidade de dizer o que quisesse, sem ter de depois aturar quem não lhe interessava ouvir.

Na busca de outros temas e de pessoas que se interessassem por novelas mexicanas, passou para a rede portuguesa de chat – ptnet – onde, numa tarde escura e fria de inverno, deu por si a sorrir das piadas malandras de um rapaz bem-disposto.

C++
(Deolinda) resistiu a seis meses de pedidos insistentes por parte de SugarLips (Joaquim), mas lá acabou por aceder a um encontro em carne e osso. Uma semana depois, namoravam:


– Queres namorar comigo, Linda? – perguntou ele, com os cantos da boca próximos das orelhas.
– Eh… está bem. E não me voltes a chamar isso.

A primeira vez que tocaram um no outro, foi com os lábios.

Acabaram por passar a Lua-de-mel em Peniche. Quatro dias, o tempo que Deolinda considerou ser o máximo que conseguia estar longe dos pais.
Nunca usou o fato de banho que a sua mãe lhe comprou, nem aceitou os insistentes convites do marido para passeios à beira-mar, por causa do vento. Passou quase todo o tempo sentada numa cadeira de plástico, no relvado das traseiras do Hotel, a ler revistas do coração.
À noite – que, segundo Deolinda, há certas coisas que não se fazem durante o dia –, assim que terminava o Jornal Nacional e ela se voltava a mexer, Joaquim procurava-a, na cama. Nas duas vezes em que acedeu aos avanços do marido, ele não conseguiu dominar os nervos e rapidamente veio ao de cima a sua falta de controlo nas situações intimas.
Sentado na cama, de costas para ela, com o sorriso escancarado, passava mais tempo a justificar-se que a fazer amor. Deolinda nunca se importou com isso: quanto mais depressa ele lhe saísse de cima, mais depressa podia aguardar o inicio da telenovela. Ainda assim, não perdeu uma oportunidade de o fazer sentir culpado.

E assim se passaram cinco estações.

À janela de casa, numa rua inclinada e escura no Bairro das Colónias, Joaquim arrepiou-se. Franziu a testa quando concluiu que, naquele Verão, ainda não tinha sentido calor. Aliás, não se lembrava de sentir calor desde Maio do ano passado.
Um homem de idade, apoiado numa bengala, tentava fazer chegar a casa um saco de plástico. Arrastava os pés calçada acima, lentamente, sem tirar os olhos do chão. Joaquim sentiu um súbito peso nos braços, soltou um gemido e fechou a janela. A sua vida tinha de ser mais do que o carregamento de um fardo.

Achava que tinha feito tudo para que a relação desse certo. Ainda no outro dia tinha ido beber uma cerveja com o amigo Tavares e ele tinha concordado consigo: não havia muito mais que pudesse fazer.
Deolinda parecia não se importar com nada, para além dos peixes no seu aquário. Nem sequer consigo própria. Cinema? Já não havia filmes como os antigos e esses, já os tinha visto todos. Passear? As condições atmosféricas eram sempre adversas. Sair à noite? O barulho e o fumo do tabaco faziam-na passar mal. Sexo? O médico tinha-lhe diagnosticado um “princípio de osteoporose”, o que limitava muito os movimentos que podia fazer… ou suportar. Férias? A praia não lhe dizia nada e tinha alergia às coisas do campo e a todos os animais que estivessem fora de água.


– Vamos conhecer uma cidade estrangeira – propôs ele certa vez, entusiasmado.
– Para quê? – respondeu Deolinda, fazendo cócegas no vidro do aquário, na direcção de um Guppy que passava.

A irem jantar fora resistia ele, que estava farto de frango assado.

(continua)


boomp3.com

domingo, abril 06, 2008

O Estojo (7)

A moldura de madeira foi montada e decorada pela mãe de Deolinda. Pintou-a de cor-de-rosa, desenhou-lhe vários vasos com malmequeres, um pequeno urso de pelúcia e, no canto inferior direito, um bouquet de flores. Colou-lhe ainda uma pequeníssima camisola em renda, feita por si, também em cor-de-rosa. O significado de tanto “rococó” – termo com que Joaquim se referiu à decoração da moldura –, explicou ao genro, era o espelho da felicidade que ela sentia por os ver felizes; a eles que eram “tão fofinhos” – o que provocou um esgar à filha.
Está colocada em cima do aquário grande – agora vazio –, junto à porta de entrada. Na fotografia que exibe, pode ver-se por entre a fina neblina que se libertava da grelha, uma Deolinda com cara de tomate, lábio inferior esticado, enquanto sopra a franja – originando um tufo capilar à Tintim – dedo indicador direito apontado à objectiva e o seu marido, já sem casaco e gravata, braço por cima da mulher, olhos cerrados e lábios repenicados, a aproximar-se da sua bochecha vermelha. Tudo sobre uma sucessão de azulejos, em vários tons de verde, com grandes círculos, onde o flash se reflecte, dando à cena e aos personagens, um ar surreal.
Dona Jesuína jamais seria capaz de o admitir fosse a quem fosse – e sempre que se lembrava disso, cantava uma canção bem alto – mas o cor-de-rosa e tanto “rococó”, eram uma tentativa de disfarçar o que lhe parecia a imagem de um pesadelo inevitável.

Os azulejos dos círculos verdes eram a nota dominante de todas as fotografias daquele dia: os avós sobre os azulejos; o neto com os avós, sobre os azulejos; os noivos com os pais, sobre os azulejos; a foto de grupo, sobre os azulejos. “Felizmente, os padrinhos foram os nossos pais… sempre se poupou os azulejos dessas fotos”, dirá Deolinda, mais tarde, quando o marido lhe ofereceu um álbum para as fotos.


– Vá, façam um sorriso, meus pombinhos lindos – disse a mãe da noiva, sorridente. – Ainda não tirámos fotografias.
– Sogrinha linda, só um bocadinho – Joaquim tirou a gravata, passou o braço pelas costas de Deolinda e preparou-se para lhe dar um beijo na bochecha quente, enquanto ela soprava os cabelos que teimavam em tapar-lhe a vista. Ia contrariar a mãe quando o flash a cegou, ao mesmo tempo que um par de lábios apertados lhe comprimiu a face.
– Mãe… – rangeu os dentes e passou as costas da mão pela cara.
– Olhe, o senhor desculpe – Jesuína agarrou o empregado da Valenciana pelo braço, quase fazendo com que ele deixasse cair as bandejas de frango com batatas e de salada que transportava em precário equilíbrio. – Vai ter que nos tirar uma foto a todos.
– Com certeza, minha senhora, mas antes, tem de me soltar – gordas gotas de suor escorriam da têmpora do homem, indo cair na salada mista.
– Aquela alface vai chegar salgada, à mesa – disse Deolinda entre dentes, esboçando o primeiro sorriso do dia.

(continua)

boomp3.com

quarta-feira, abril 02, 2008

O Estojo (6)

A assinatura do contrato processou-se sem atribulações de maior e foi já com um sorriso menos evidente, mas mais natural, que Joaquim entrou no restaurante onde ia decorrer o copo-de-água com a mulher pelo braço.
O almoço foi ali para os lados das Amoreiras, na Valenciana que, segundo Joaquim, “tinha uma sala ampla e arejada”, não contando que os fossem sentar próximo do grelhador, nem que a extracção de fumos não desse resposta a tanto fumo.

Deolinda não conhecia o sítio, mas aceitou prontamente quando a vizinha Celeste lhe disse que o restaurante tinha fama nos frangos assados.
Foi, portanto, com manifesto desagrado que ouviu da boca do empregado a ementa:


– Temos canja de galinha, bacalhau no forno com batata a murro e febras na brasa. A sobremesa pode ser…
– Psst, psst… – o avô de Joaquim puxou o empregado pelas calças. – Oiça lá, e para molhar o gógó?
– Para beber, há tinto da casa, sumos e águas – sem ter conseguido ouvir, a mulher repetiu-lhe as opções ao ouvido.
– Esse tinto é de onde? – gritou o idoso.
– Da zona de Aveiras… e para sobremesa, pudim, leite-creme ou mousse de chocolate – e foi-se embora, apressado.
– Então, mas eu… pensava que… – Deolinda tentou articular uma frase coerente, mas as ideias atropelavam-se. Olhava para o marido, mas não o via. – Tu… tu não…

– Dois pratos, hã!? Carne e peixe! O senhor não disse, mas o café e um chiripiti no fim, também estão incluídos – afirmou ele, com manifesto agrado.
– O teu avô não consegue roer as febras, que não tem dentes – a avó, do outro lado da mesa, franzia o olho direito na direcção do neto. – E eu é coisa que também não aprecio, que a carne fica sempre seca e rija.
– Comam frango, prontos! Eu peço ao senhor para trocar.
– Eu
também quero frango – as palavras saíram de dentro de Deolinda arrastadas e cortantes, como se fossem feitas de ferro demoradamente afiado.

Entretanto, a sua cabeleira sucumbira ao fumo dos grelhados e tinha-lhe caído para os ombros e para os olhos. A sentir um calor cada vez mais insuportável a subir dentro de si, soprava a franja com evidente má cara, quando o avô berrou sem destinatário definido:


– Em Aveiras também há vinho?

(continua)

boomp3.com