sexta-feira, janeiro 27, 2006

Post 55

Depois de Plan 9 From Outer Space, da Area 51, do Códice 632 e do Envelope 9, chegou o Post 55.

“Mas o que será isso”?, perguntam vocês. Pois bem, o Post 55 não é mais que o fruto da minha pouca inspiração e debilitada disponibilidade mental para textos minimamente interessantes.
Tenho resistido a escrever sobre as presidenciais, as escutas, a governação socrática, sobre o sr. Nuno e o Veiga, mas não consegui resistir a fazer um balanço da minha actividade blogueira. É isso o Post 55.

Ainda está aí alguém?
Como não tenho mesmo nada melhor para fazer, vou continuar.

Estava eu aqui sossegado a apertar os parietais, tentando assim forçar as sinapses, na esperança que brotasse texto, quando, a meio de um bocejo, reparo que tinha publicado 54 textos. Sendo 4 deles parentes do Post Scriptum, 50 eram textos a valer, frutos do meu pomar cerebral.
Bocejo suspenso, súbita incandescência da lâmpada de 15W que me ilumina as ideias – foi tal o sentimento que me avassalou que até a bola de espelhos que se me suspende da caixa craneana, começou a rodar. 50 posts… tinha tido uma ideia: é tempo de balanço!!

Na verdade, não se trata de balanço nenhum. É apenas uma reflexão sem jeito nenhum para não estar muito tempo sem publicar.

Lembrei-me de uma conversa que tive há poucos dias, em que me queixava de, no início, não ter divulgado o blog; de durante muito tempo apenas meia dúzia de pessoas o conhecerem. Que assim os primeiros textos tinham sido lido por muito poucas pessoas – ah, vaidade que me atraiçoas.
Recomendaram-me que os publicasse de novo, mas isso não sou capaz de fazer, não faria o mínimo sentido. No entanto, e visto que se assinalam os 50 textos, lembrei-me de deixar aqui um link para o primeiro texto, para o inicio de tudo: chama-se “O Último Comboio” – está dividido em várias partes mas acho que até se lê rapidamente (parte I, parte II, epilogo).

Não posso deixar de repetir aqui algo que já escrevi antes: eu misturo muito realidade e ficção, tenham isso em conta.
Dito isto, quero agradecer a quem me deu os parabéns pelos 23 anos e dizer-lhes que só faço anos lá pelo calor e que os 23 já lá vão há um tempo.
É por estas e por outras que eu não publiquei um texto sobre um ribatejano, marialva dos quatro costados, macho latino típico, campino orgulhoso, que se envolve com outro campino – este grande dançarino de fandango e toureiro de renome na aldeia – numa relação homossexual tórrida em plena lezíria.
Como tinha sido escrita na primeira pessoa, ainda iam achar que eu gostava de tourada!
Entretanto estreou o “Brokeback Mountain”, o filme sobre dois cowboys gay, e o texto perdeu actualidade.

Pois é, isto anda mal para estes lados. Vamos lá ver se dá para mais 50 posts.

segunda-feira, janeiro 23, 2006

Me and Johnnie

“Parabéns a você, nesta data querida…”

Os versos ecoam na minha cabeça. Não consigo deixar de pensar na ironia: “nesta data querida”… nada mais errado. Hoje é o dia do meu aniversário e tem sido o dia mais triste da minha vida!
Felizmente está a terminar, mais uns minutos e já é amanhã. Pode então começar o processo de cura, de recuperação desta maldita depressão.

Estou sozinho. Longe de casa, longe da família, dos amigos – dos poucos que tenho. Na verdade, isto não é inteiramente assim, sem o meu fiel companheiro Johnnie Walker não teria chegado aqui.

(Peço desde já desculpa por qualquer coisa, é que o Johnnie ajuda a passar o tempo mas dificulta muito acertar nas teclas certas).

Não tenham pena de mim, se há coisa que eu detesto é perceber que alguém sente pena de mim.
Estou aqui por opção própria, ninguém me obrigou. Também não culpa de ninguém que eu não tenha dito aqui aos meus conhecidos que hoje fazia anos. Como é que eu posso ficar magopado com eles por não me terem dado os parabéns, se ninguém sabe?
Sou uma besta difícil de entender e supurtar. Tenho este orgulho – ou lá o que é -, n~ão digo nada a ninguém e depois venho para o computador aliviar a tristeza, a solidão que sinto… sentir pena de mim próprio ah pois é. Como se isso fosse possível. Sou mesmo um triste, só tenho o que mereçºo.

(Alguém me sabe dizer se hà problema em entornar whyski em cima do teclado?)

Sai, fui aos locais habituais em busca dos (poucos) conhecidos que aqui fiz Acho que marrependi de não ter dito nada. Ia por o meu melhor sorriso, dar uma palmada nas costas deles, oferecer uma rodada e anunciar “hoje faço 23 anos, pá weeeeeeeeeeeeeeeeeeeee
Mas nada,, ninguém, corri todos os locais habituais – e os outros, para ser francxo – em vào. Não vi ninguém.
O problema, se calhar, foi ter visto imensa jente: logo calha ser hoje o dia da festa anual aqui da terra Anda tudo na farra, a divertir-se… e eu aqui na merda. Abençoado santo que não deixa que nada de mal aconteça a estas maravilhosas pesoas que aqui moram que são simpáticas como já não se fasem em lado nenum do mundo…e dos arredores tambem
Anda cá Jonnie, só tu me compreendes.

A feira estava animada, muita luz, muito barulho, muita gente, muitos sorrisos… tanta tristeza, tanta solidão… tantá alccol.

(o uisky deixa nódoa na roupa? Lá se vai o pólo da river hoods sim que hoje vestime todo catita para ir a rua comer uma fatura cós amigos do peitu)

onde estariam eles, cambada de desgraçados? Dei umas quantas voltas pela localidade e nada já tava a ficar tonto com tanta volta. Sentei-me nos degraus do pelourinho, à espe ra que alguém passasse quand o achei que nos poderíamos estar a desencontrar, mas nada nem a porrea da dor de caneçaa paçou
estou a tornar-me amargo, muito amargo e fiz hoje 23 anos. Sinto as entranhas a serem corroídas pelo fel e a cabelça pezada feita num oitue já nem esto a ver a direitu
por falar em amargo, vamos lá afogar esta treta mais um boucado.

ois meus pais ligaram-me ee o meu irmão também essas nunca se esuqcem, eu gosti muito deles Mais ninguém se lembrou
É bem feito, desde que ma lembro que sou gente que paso a vida a dizer que não ligo aos aniversário,s que na quero saber diso para nmada. Só tenho o que mereço.
nâo tenho é que depois, me sentir assim… e sempre me senti assim, sempra pá, neta altura do ano9i é sempre o mesmo este ano só está é a ser um pouco pior mai nada.
Mas acabous, acaba aqui, vou imprimir este texto e mandarr a toda a gente que conheço por carta, á antiga: eis-me em todo o meu te rível e obescuro esplendor, apreciem a tristesa, o azzedome, a solidao. Este é que sou eu. O pra mim aqui
V~am ver se não fasso isso

e este filho da puta que n tem outra nonme do meu vizilho do lado que n para de ouvir Bom Jovi em altos berros??
cala-teeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee cabrao

eu agora tame a abetecver falar com dues quese deve tar a divertir mas na lje vou dar esse prser

um dia tã~o triste e ^é meu não devia ewxistir um dia assim jamais o vou esquece r mas n o quero recordar só qero que passse
hoje quase n me consegu i suportar eestou farto de mim
acho que ma lembra de algem me ter ditoumacerta vez que os piores momentos sao aqules em que se perde alguem discordo!!!11111 nao á nada pior do que nao ter ningue m para perde,r percebi isso hoge á minha custa quando me vi taop fundo que ja nem cair podia

~´e um dia q cvou agradecer ter subrevivido… esperooe agora vsu choraer

sao onse e quase meiaanoittttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttttt

quarta-feira, janeiro 18, 2006

A Cena Seguinte

Perseguidos, correm pelas rochas, junto ao mar. Passam por uma espécie de gruta e conseguem, finalmente, alcançar os botes. O som atrás deles aproxima-se e é assustador. Sabendo o que os persegue, o receio de serem apanhados enche-lhes o coração de terror.
Ela é a única que sente o que se passa de maneira diferente. Sabe algo que os restantes desconhecem, é que esteve com ele, conhece-o um pouco melhor. Sabe que apenas a quer a ela e pondera sacrificar-se pelo grupo.
Nem todos conseguem chegar aos botes, mas para alguns parece haver esperança quando, no último minuto, ele ali está, imenso, brutal. Estão condenados. Emite sons que são de vitória, também ele sabe que conseguiu o que queria.
Será mesmo assim? Nós sabemos que não, mas é suposto estarmos agarrados pelo suspense da cena.
Num gesto desesperado e derradeiro, Carl Denham arremessa o frasco de clorofórmio contra a besta. Sucesso, mesmo em cheio, junto ao nariz. O animal ergue-se, emite agora sons desesperados, terá percebido a derrota. Em pouco tempo jaz no chão, inanimado. O grupo estava salvo.
Ela não conseguiu esconder alguma tristeza, tinha pena dele, apesar de tudo. Ninguém no grupo percebeu isso, só a nós foi mostrado.

Na semana passada consegui ir ao cinema, esse ritual de outros tempos posto de lado devido a circunstâncias várias.
Fui ver o filme do macaco, o “King Kong”.
Uma das razões que me levou a ir ver o filme foi o argumento. Tendo este péssimo hábito de escrever alguma ficção, a questão do argumento – que sempre foi importante para mim -, assumiu uma importância ainda maior. Estou sempre bastante atento à maneira como a história é contada, como é que as ideias/situações se encaixam e fazem avançar a história.
Naquilo que escrevo perco algum tempo à procura da melhor maneira de tudo se encaixar: as acções, as ideias, as personagens. E desespero um pouco quando elas se complicam.
Ora no filme do macaco eu tinha alguma curiosidade em ver como iriam ser resolvidos alguns problemas práticos que eram fáceis de antever. Desde logo como é que, com tecnologia do início do século XX, conseguiriam os nossos intrépidos heróis içar um bicho daquele tamanho para o barco… e transportá-lo sossegado durante várias semanas até Nova Iorque.
Eu dou de barato a existência de macacões enormes, dinossauros, baratas gigantes, aranhiços descomunais, etc, apenas tinha curiosidade em saber como é que esta fauna incaracterística interage entre eles e, especialmente, com os humanos civilizados.

Flashback. Está o Kong cloroformizado nos rochedos à beira mar, suspiram os nossos exploradores de alivio e eu, ansioso, quase me levanto, “e agora, como é que o põem no navio”?
Muda a cena e o macaco já está num palco teatral de Times Square, NY!! – já agora, como é que entrou tão grande criatura no teatro?, pela porta das traseiras não deve ter sido.
Ou seja, isso não interessa nada. Eu é que sou parvo em me preocupar com isso. Até por escrever umas coisas, devia ser o primeiro a saber que esses detalhes são isso mesmo: detalhes! Coisas sem importância em algo muito maior, que é toda a história.

Dava jeito que a vida fosse como nos filmes que, nos momentos difíceis do guião, pudéssemos passar para a cena seguinte, aquela em que tudo já está resolvido e o drama passou.
Recentemente, à minha pergunta de como iam as coisas, alguém me respondeu “está tudo na mesma, as mesmas chatices de sempre… estou à espera que passem”. Num primeiro momento, estive quase para responder que tinha sérias dúvidas sobre a bondade dessa atitude; que quem muito espera, desespera; que varrer para debaixo do tapete não resolve nada, apenas esconde por um tempo a situação e que, quando o problema se voltar a manifestar (porque volta sempre), será muito pior lidar com ele. Estive quase para dizer que há que enfrentar as situações, confrontar os problemas, confrontar quem gostamos, nós próprios se for necessário; que temos que falar sobre o que nos vai cá por dentro.
Em devido tempo todo esse discurso me soou a uma sucessão ineficaz de frases feitas e lugares comuns. Falar é fácil e calei-me.
Acho que foi também por me ter lembrado da imagem do macaco anestesiado junto à rebentação e, logo de seguida, amarrado no teatro. É que, pensando bem, pode mesmo ser que, para esta pessoa que espera, a cena seguinte seja já uma em que tudo se tenha resolvido e não haja necessidade de nos preocuparmos com nada.
Apesar de não ser filme, de se tratar das nossas vidas.

PS - Refuto o parágrafo em que digo que os detalhes não me interessam. Não há volta a dar, dou-lhes mesmo importância, acho que deviam ter perdido tempo a pensar em como é que metiam o macaco no navio e, depois, dentro do teatro. Defeito meu.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

O Erro Do Meu Erro

Ainda a propósito do meu último texto. Algumas pessoas apontaram um erro ao meu erro: que a associação do nome da localidade de nascimento de Leonardo estava de tal interiorizada pelas pessoas, que já não há como uma coisa não signifique a outra e, portanto, é perfeitamente aceitável que o livro do Dan Brown se chame “O Código Da Vinci”.

É, também, para mim evidente que sim, que têm razão. Não me passa pela cabeça que haja quem não saiba de quem se esteja a falar com aquele título, que se está a falar de uma pessoa e não de um local e que essa pessoa seja Leonardo – apesar do título não ser “O Código de Da Vinci”.

Eu usei esse exemplo precisamente por isso!
Entendendo eu que, do ponto de vista estritamente literal, existe um erro – e talvez erro não seja o termo mais adequado, apenas o usei na falta de melhor termo -, muito poucas pessoas pensa nisso exactamente por o nome da localidade e o da pessoa estarem enraizadamente associados.
O objectivo do texto era fazer um paralelismo dessa situação com as nossas vidas: haver coisas – comportamentos, opiniões, maneiras de ser, de pensar, filiações, etc -, que, por estarem de tal maneira interiorizadas em nós, deixaram de ser questionadas, tornaram-se dogmas. E isto, desde logo, porque muitas vezes já nem damos por elas… um pouco como quando vamos a conduzir não necessitarmos de racionalizar que antes de meter uma mudança, temos de pisar o pedal da embraiagem.
(Possivelmente, resume-se tudo à minha dificuldade em lidar com dogmas e fundamentalismos e achar que, antes de lidarmos com os que nos tentam impor, devíamos lidar com os auto-infligidos).

Não terá sido o melhor exemplo e não terei conseguido explicar o meu ponto de vista, por isso esta tentativa de concretizar um pouco melhor a ideia que estava por detrás do texto anterior.

Agradeço, mais uma vez, a todos as vossas opiniões.

terça-feira, janeiro 10, 2006

O Erro de Exeter, New Hampshire

Numa noite fria de Outubro de 1999, estava eu à procura de metades de amendoim numa tigela cheia de sal e fava-rica, no bar do costume, quando chega o Hugo.

Não sei se se recordam, mas em 1999 vivia-se a febre da (suposta) passagem do milénio: o Y2K aterrorizava as almas, era a electricidade que ia faltar, os computadores que iam deixar de computar… o caos ao virar do ano. Para os mais crédulos, a profecia do fim do mundo ia cumprir-se, os sinais estavam todos lá.

- Pessoal, vocês sabem que eu não sou crente nem crédulo, mas fiquei esta manhã a saber de uma coisa que me deixou perturbado – diz o Hugo com ar sério e nervoso. – Então não é que a passagem de ano vai calhar a uma sexta-feira 13? Depois de saber isto já não sei se no que acreditar.
Todos achámos um tremendo disparate, mas ninguém percebeu. Ficámos boa parte da noite a desancar nas teorias absurdas de que o mundo ia acabar, até porque, na verdade, a passagem do milénio seria só no ano seguinte.
O Hugo agora já não parecia preocupado, apenas bastante divertido. Umas três cervejas depois, tossicou, fez uma pose e disse: - Eu tenho-os ouvido com atenção mas há uma coisa que eu ainda não percebi: como é que a passagem de ano vai acontecer no dia 13…
Silêncio. Os presentes naquela mesa entrecruzam olhares durante vários segundos. Depois, a galhofa geral e o reconhecimento de que tínhamos sido uns otários.
Contada com o devido ar sério e com a entoação correcta, aquela estória enganou muita gente.

O titulo deste post é outro exemplo de como certas coisas nos escapam. Vou tentar explicar: ele está relacionado com o Dan Brown, autor d’ “O Código Da Vinci”. É que também o título desse livro lido por milhões de pessoas, contém um erro tão evidente que a maioria dos leitores não dá por isso.
O nome do livro remete para uma pessoa: Leonardo da Vinci. Só que o nome do senhor, como era frequente na altura, significa Leonardo DE Vinci, sendo que Vinci é a localidade onde ele nasceu e não um nome de família, um apelido que o distinguisse, por assim dizer, de outras famílias.

Ou seja, o nome do livro remete para uma pessoa mas de uma forma errada. Era o mesmo que dizer que se o livro tivesse sido escrito sobre alguém conhecido como o Fanã da Baixa da Banheira, se chamaria “O Código da Baixa da Banheira”. O que remetia para o local e não para a pessoa - Exeter é o local onde o Dan Brown nasceu.

Isto tudo para simplesmente dizer que, muitas vezes, quando as coisas são demasiado óbvias, não as vemos, escapam-se por entre os nossos dedos como areia fina.
Da mesma maneira, temos tendência para não questionar certas coisas só porque elas sempre foram assim ou são assim há muito tempo.
E isto também sobre nós próprios. Não devíamos vir programados para, tal como os automóveis, fazermos uma revisão periódica de quem somos, do que queremos? Questionarmo-nos a nós próprios - sem, evidentemente, nos colocarmos em causa?

quarta-feira, janeiro 04, 2006

Mudar

O pai de um amigo meu fumava imenso e, à pergunta do porquê de não parar, respondia sempre que o seu organismo estava de tal modo dependente da nicotina que já não conseguia passar sem ela; mais, não encontrava nele a força de vontade necessária para conseguir deixar o tabaco. Já tinha tentado algumas vezes mas falhava sempre ao fim de pouco tempo.

Um dia teve um enfarte agudo do miocárdio e escapou por pouco, por muito pouco. Segundo o médico, foi uma segunda chance, como que nasceu de novo. Foi também avisado: o próximo cigarro seria o último.
Nunca mais fumou. Nesse dia percebeu com particular clareza o quanto queria viver.
O tal corpo que já não vivia sem nicotina, a tal força de vontade que lhe faltava, não significavam agora nada. Confrontado com a morte, foi fácil fazer aquilo que há bem pouco tempo lhe parecia impossível.

Pergunto: que necessidade é esta de sermos confrontados com algo definitivo para, finalmente, fazermos aquilo que até já sabíamos que devia ser feito?
O que é preciso para mudar-mos?

Por vezes, é preciso perdermos algo importante para que haja, dentro de nós, um impulso definitivo que nos leve a agir - talvez porque só tenhamos real consciência do que tínhamos quando o perdemos.
Talvez porque só aprendemos realmente à nossa custa, perante a factura que nos vêm cobrar.
Casa roubada, trancas na porta.

(O perigo de generalização existe, mas é assumido).

Na segunda-feira passada de manhã, conduzi a 130 Km/h na Segunda Circular, por entre o habitual trânsito intenso.
Tenho perfeita consciência do disparate, de que bastava um pequeno acaso – daqueles em que a vida é fértil -, para que algo de consequências potencialmente graves tivesse acontecido. E de que, caso algo tivesse mesmo acontecido, iria pensar muitas vezes que se pudesse voltar atrás…
Então porque não evitar antes que aconteça? Porque não prevenir?
Vem-me à ideia a natureza humana, mas disso eu percebo pouco, sei apenas que não o devia fazer, mas também sei que se amanhã o trânsito permitir, corro o risco de o fazer de novo.

Vou ser optimista (!!!): o primeiro passo para que se mude, penso ser o ter consciência da coisa – e esse está dado; o segundo, talvez seja ter consciência da coisa no momento em que estamos a fazer algo que sabemos ser realmente errado – sim, tudo bem; por último, seria conseguir evitar fazê-lo – a tal força de vontade em acção…e é aí que tudo se complica.
Simplista? É bem possível.

Este tipo de situações serão, ainda assim, mais fáceis de racionalizar, de nos deixar vislumbrar um modo de actuar, uma maneira de iniciar uma mudança. Quer-me parecer que, no que diz respeito às relações entre pessoas, as coisas são mais complicadas.

Quando, a determinada altura de uma relação amorosa, se percebe que algo não está bem, pura e simplesmente não paramos para analisar as coisas friamente, “hmmmm, isto não está bem, vamos lá mudar o que é necessário mudar”.
São muitas as coisas envolvidas, as dúvidas, as incertezas, os prós, os contras – há quem prefira até anular-se, de alguma maneira, a despoletar um conflito… vão recolhendo à sua concha.
O mesmo se passa nas relações sociais, profissionais e de amizade, em que impera um certo egoísmo/ego centrismo.

O que é, então, preciso para mudar-mos? O que é que nos dá a coragem necessária? Que acontecimento definitivo pode haver numa relação que nos faça tomar uma atitude?