quinta-feira, fevereiro 17, 2011

A Porta do Amor


Se o Destino marca a hora, o Amor tem hora marcada: fecha para almoço e não abre aos fins-de-semana e feriados. O Amor faz pontes – entre as pessoas e não só. Quem o procura muito cedo ou já tarde, não o encontra disponível. No outro dia, passei-lhe à porta e fiquei a observar.

Vi que há quem ande à procura dele e nunca o encontre, e que há quem dele não queira saber e, para sua própria surpresa, encontre a porta escancarada. Há quem venha aos pares, em grupo, e quem venha sozinho. Vi que há quem venha de longe só para ter acesso ao Amor e que acaba por passar todo o tempo a bater a portas erradas. Ao mesmo tempo, outros que sabem qual é a porta certa, não fazem outra coisa que é procurar razões para não entrar, por muito que os chamem lá de dentro, nunca passando da soleira da porta.

Se muito estranhei o facto de toda a gente conseguir entrar no Amor, que a porta se abra a qualquer um que a ela bata, mais ainda estranhei que uma parte significativa das pessoas saia ao fim de pouco tempo. Não tivesse eu presenciado, teimaria que era impossível a um mesmo rosto conter a capacidade de expressar emoções tão díspares: solar à entrada, lunar à saída. Corpos alquebrados, que se afastam, cruzam-se com o passo lesto e jovial de quem chega. Para uns há sorrisos, para outros, nem sequer indiferença. Mas, ao fim de algum tempo, há quem volte a trilhar os caminhos daquela rua, novamente animados e confiantes… para depois voltarem a ter de ir embora, cada vez mais amargos e descrentes de tudo. Para mais uma vez regressarem, e outra vez se terem de afastar… Parece haver quem faça deste pêndulo a razão de sua existência. Optimistas, ouvi alguém chamar-lhes. Discordo. São os pessimistas que têm a capacidade de regressar uma e outra vez, enquanto houver forças: o simples facto de os deixarem entrar é razão suficiente para fazer o percurso, enquanto que ao optimista uma desilusão é quanto baste para mais nada querer do Amor – ou assim julgam, pelo menos. Mas também vi suspiros de alívio ao se sair de lá, acompanhados de promessas irrevogáveis de nunca mais cair no erro de ali regressar.

É fácil ficar confundido com tão intensas emoções, à porta do Amor. A certa altura, eu já sentia a dor e a solidão de quem vai e, ao mesmo tempo, a alegria e a efusividade de quem vem. Chorava e não sabia se era de dor, se de contentamento. E foi então que reparei nelas. Que pessoas são aquelas que têm a tão grande responsabilidade de deixar entrar e sair do Amor? Que sentem elas? Não me admiraria que de tanto sentir, nada sentissem já. Se bem me interroguei, melhor fui à procura das respostas. Atravessei a estrada e bati à porta, que logo se entreabriu com um sorriso. Como é que decidem quem fica e quem sai? Atirei eu logo, sem mais. Não somos nós que decidimos. Entra quem consegue ter a coragem de conseguir entrar. Franzi o sobrolho e ela continuou. Há muito o convencimento que o Amor é acessível e justo, mas o Amor é difícil; o que custa não é entrar, é aceitar o compromisso que se exige a quem cá quer ficar.

Voltei para o sítio onde estava e limitei-me a fotografar a porta do Amor.



(como é evidente, no que à placa na parede diz respeito, esta foto foi grosseiramente manipulada)