sexta-feira, setembro 30, 2005

Pedimos Desculpa Pela Interrupção...

... o programa segue dentro de momentos.

Devido a um irritante problema informático, não vai ser possivel publicar hoje a parte IV d'A Linha (por motivos de força maior, só na próxima terça-feira conto poder dar seguimento à história).

A todos o meu obrigado e votos de um óptimo fim de semana.

terça-feira, setembro 27, 2005

A Linha (parte III)

Faltava um segundo para o enorme ponteiro do relógio chegar ao número doze, quando Luís abriu os olhos. Parecia ter sido acordado pelo imperceptível clic que o mecanismo fez ao entrar no último segundo das 10h59.
Era uma curiosa característica sua, parecia ter uma habilidade para se antecipar aos relógios. Nunca tinha precisado de despertador para acordar, antes da hora certa, estava já desperto.
Não menos curioso, no entanto, era o facto de que, caso não se lembrasse de ligar o despertador, não conseguia acordar por si à hora marcada.
Só não precisava do despertador se este estivesse a funcionar!

Onze horas. O calor não desarmava. Perguntou a si próprio se teria dormido durante aquela hora ou se teria estado ali, a observar o que acontecia à sua volta. Pareceu-lhe ter sonhado; com o Porto, a Faculdade, com Gonçalo, com Mónica.

Subitamente, foi tomado pelo terror. A sensação de ter uma mão dentro de si a apertar-lhe o coração, arrancou-o ao torpor em que se encontrava. A mochila! Tinha ficado sem ela. Sem dúvida que sim. Como poderia ter sido tão estúpido ao ponto de a ter pousado e ter adormecido. Tinha perdido tudo!
Olhou para baixo da sua cadeira com o medo estampado no rosto. Levou uma mão à testa banhada em suor. Não queria acreditar na sua sorte, a mochila ainda lá continuava. Num lugar como aquele, a mochila tinha permanecido onde a largara por mais de uma hora. Levantou os olhos para o tecto e sorriu. Havia que agradecer um tal milagre, pois só podia tratar-se de um milagre.
Após uma rápida verificação do conteúdo, prometeu a si próprio que tal situação jamais se poderia repetir. À parte algum dinheiro que tinha nos bolsos, tudo o que trouxera consigo estava naquela mochila: cartão de crédito, dinheiro, o passaporte, uma muda de roupa, pilhas, um estojo com alguns artigos de higiene, um mapa, o bloco Moleskine para apontamentos, o leitor de MP3 com a banda sonora da sua vida, a Lomo que tanto prezava e com a qual pretendia fazer um diário de viagem em imagens.
Perder tudo aquilo seria acabar com a sua viagem mesmo antes de ela ter realmente começado.

Ao fazer a mala no seu quarto no Porto, tinha seguido um principio muito seu: se vais caminhar sobre gelo fino, viaja leve. E aquela sua viagem seria toda ela feita sobre uma fina placa de gelo, sentia-o.

Estava preso por arames. Tinha a mente colada ao corpo com cuspo. Toda uma vida vivida a andar para a frente, tinha, nos últimos tempos, estagnado. Qual automóvel sem combustível, também ele não conseguia sair do mesmo sitio.
Confrontado com o que tinha sido a sua vida, não gostou do que viu, do que tinha conseguido para si. Depois de tantos anos, só recentemente tinha percebido isso e não resistiu ao escrutínio.

Já lhe tinha acontecido antes. Ser confrontado com algo inesperado, com uma daquelas coisas que nos fazem repensar toda a nossa vida, quem somos, o que temos e o que queremos para nós. Só que dessa vez tinha conseguido que as coisas fizessem sentido para si. Tinha arranjado um espaço no seu interior, um canto, e tinha lá arrumado a sua análise do sucedido.
As decisões, essas colocou-as em prática, eram simples: teria de se esforçar mais para ser uma pessoa melhor, para compreender os outros; teria de ser mais paciente, mais sincero – consigo e com os outros. Engoliria o orgulho e daria a outra face. Iria ser ainda um melhor amigo dos seus amigos, um melhor filho dos seus pais, um melhor irmão do seu irmão. Magoado, responderia assim.

Dessa vez foi fácil, desta não. Não tinha percebido o que lhe aconteceu. A razão de ter acontecido. Ele que tinha feito um esforço sincero para ser essa tal melhor pessoa. Não merecia isto. Porquê?
A falta de resposta tinha-o levado a Union Station. Num dia quente, sentado numa cadeira maltratada, perguntava uma outra vez a si próprio, “porquê”? Mais uma vez não obteve qualquer resposta e quase desesperou. Teria deixado escapar uma lágrima se, ao levantar os olhos, não tivesse visto uma criança que, olhando para si, sorria.
Sentiu-se mal por estar a sentir pena de si próprio e sorriu de volta. Tinha uma viagem para fazer. Uma viagem que, verdadeiramente, só agora ia começar. Iria procurar o terminal rodoviário e entrar no autocarro que o levaria até à primeira localidade na Route 66 depois de Chicago. Passaria aí a noite e, bem cedo, procuraria boleia, alguém que o levasse por mais alguns kilometros nessa estrada que pertencia ao seu imaginário. A Estrada Mãe, como era conhecida.
Apesar de já pouco ter a ver com aquilo que a tornara mítica, aquela era a sua viagem de sonho, a viagem que tinha que fazer. Perder-se-ia nela, nas paisagens a perder de vista, nos rostos dos desconhecidos com quem se cruzaria, para se tentar encontrar.
Não tinha pressa, viajaria conforme as boleias que conseguisse e aproveitaria todas as oportunidades que surgissem de ganhar alguns dólares, aceitando os biscates que pudesse. Pelo menos era assim que tinha as coisas pensadas.

Ao sair da estação, o sol cegou-o. Fechou os olhos e duvidou se seria capaz de continuar. Teve que se obrigar a abrir os olhos e a andar.
Do outro lado, no fim do caminho, estava uma fotografia centenas de vezes por si imaginada: gaivotas pousadas no cais de Santa Mónica. A preto e branco.

segunda-feira, setembro 26, 2005

A Linha (parte II)

Lembro-me perfeitamente da primeira vez em que a vi. Era um dia ameno de Setembro, curiosamente, foi quase à hora exacta em que o Verão terminava.
Saía da secretaría da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, parou no último degrau e olhou em volta. Uma ligeira rajada de vento, como que anunciando a chegada do Outono, agitou-lhe os longos e ondulados cabelos castanhos.
É curioso como nos esquecemos de tanta coisa significativa nas nossas vidas, mas nos lembramos destes pequenos nadas, destas aparentes insignificâncias.
A verdade é que me lembro perfeitamente. Lembro-me até do local onde, por sorte, consegui estacionar, no parque do lado da Rua Dr. Roberto Frias, de como, ao chegar ao edifício da Administração, a vi.
Vestia um pólo azul-escuro e uns jeans algo coçados, calçava uns ténis castanho-escuro. Nunca tinha visto antes e nunca mais voltei a ver uma rapariga que ficasse tão bonita vestida de uma maneira tão casual.

Não tive coragem de admitir isto antes a ninguém, nem mesmo a mim próprio tal a enormidade do que me aconteceu, tal a dificuldade em explicar tal coisa mas, naquele momento, foi como se se tivesse estabelecido uma linha entre o meu coração e aquela rapariga. Algo que me unia a ela, alto forte mas, ao mesmo tempo, ininteligível.
Não percebi isso na altura, aliás, só há muito pouco tempo o percebi, mas apaixonei-me naquele momento.

Era o primeiro dia de aulas na FEUP e enquanto ela ali ficou, naquele degrau, a observar tudo à sua volta, certamente pensando na nova fase da sua vida que estava a começar, também eu fiquei ali parado, no meio do estacionamento, a olhar para ela.
Destacava-se de todas as outras; não por qualquer particularidade física mas pelo olhar. Apesar de poder parecer um pouco perdido naquele instante, senti naquele olhar determinação e confiança. Era seguramente uma mulher forte, que não se deixava intimidar, que não hesitava.
Tive a certeza que poderia ser amigo dela.

Uns anos mais tarde recordei aquele momento e constatei que não me tinha enganado, mas também que não tinha percebido a totalidade daquela rapariga, houve coisas que não vi naquele momento e com as quais acabei por ser confrontado.

Se eu acreditasse nessas coisas, diria que tinha sido o destino. Mas a verdade é que Mónica, assim se chamava, viria a ser da mesma turma do Gonçalo, o meu melhor amigo. Estavam ambos em Engenharia Civil, eu em Engenharia Electrotécnica e de Computadores. Depressa se criou uma amizade entre ambos e entre mim e Mónica.
Em pouco tempo tornámo-nos quase inseparáveis. Apesar da diferença de cursos, do pouco tempo há que ela nos conhecia, a verdade é que estudávamos muitas vezes juntos, saiamos juntos. Apoiávamo-nos uns aos outros.
Estabeleceu-se entre nós uma relação especial, uma amizade sólida, forte. Éramos os melhores amigos, praticamente como irmãos. Sim, irmãos…

E um dia percebi-o. Interroguei-me se seria isso que eu queria, ser só um bom amigo da Mónica. Se, quando eu pensava no quanto gostava das sardas que ela tinha no nariz e nas maçãs do rosto, da piada que achava à covinha que ela tinha no queixo, se isso não seria algo mais do que uma boa amizade.
Dei por mim a sondar o Gonçalo sobre um possível interesse dele na Mónica. Lembro-me do quanto fiquei feliz por me ter dito que não, que só tinha olhos para a sua vizinha do 5º esquerdo e de como ela o tratava mal.
Durante grande parte do segundo semestre, perguntei-me várias vezes se me estaria a apaixonar por ela, se não estaria apenas a confundir uma forte amizade com amor. Não sabia e tive receio de tentar saber. Receei que se tentasse saber acabasse por perder a namorada e também a amiga. Fingi a mim próprio que não era nada.
Nem com o Gonçalo fui capaz de falar. Nem no dia em que me perguntou porque andava estranho, porque os andava a evitar.
Consegui convencê-lo de que era um disparate achar isso. Nunca tinha estado tão bem e para não deixar dúvidas, pouco tempo depois apresentei uma namorada. Era a rapariga que trabalhava na papelaria perto da Faculdade, a Cláudia. De tanta vez lá ir tirar fotocópias percebi uns olhares de interesse por parte dela. Sem grande convicção, um dia convidei-a para sair, aceitou e nessa mesma noite “começamos a andar”.
A Mónica felicitou-me, deu-me os parabéns. Observei-a atentamente tentando descortinar algo na sua atitude; acho que tinha a secreta esperança de conseguir ver alguma tristeza no seu olhar, uma ponta de mágoa. Isso teria sido o suficiente para me dar a coragem que me faltava para lhe dizer que aquele namoro era uma brincadeira, que eu gostava era dela. Mas nada. Não vi nada e convenci-me que tinha feito bem.
É hoje mais do que evidente que ela não me iria dizer que eu estava a fazer um disparate, que largasse a rapariga e ficasse com ela. Nunca o diria. Se fosse ela a aparecer com um namorado eu também não diria nada.
O Gonçalo achou muito estranho aquele namoro; como é que eu nunca lhe tinha dito nada? Ficou algo sentido, pelo menos achou que era mais meu amigo que eu dele, disso tenho a certeza.
O namoro não durou muito, claro. Com ele consegui várias coisas: magoar a Cláudia, que não merecia nada disto; afastar a Mónica; afastar o Gonçalo e ficar com muitos problemas de consciência.
Cada um de nós se embrenhou nos estudos e deixámos o tempo correr.

Com o final das aulas a Mónica foi para Valença, a sua terra, o Gonçalo para o Algarve e eu fiquei no Porto. Consegui um trabalho a ajudar um topógrafo e tentei esquecer.
Não consegui.
Os primeiros tempos do segundo ano do curso decorreram em aparente normalidade mas a nossa relação já não era a mesma. Já não riamos à gargalhada com os disparates uns dos outros, já não íamos tanto ao cinema nem ao teatro, já não almoçávamos sempre juntos na cantina da faculdade.
Fiquei a saber que a Mónica tinha começado a namorar com um rapaz em Valença, ao que parece, um GNR lá colocado. Uma amiga comum achou que eu devia gostar de saber. Não gostei, mas achei normal, claro que sim, o contrário é que seria estranho. Nunca abordei o assunto com ela nem ela comigo.

Decidiu-se, com outros colegas da faculdade, passar a passagem desse ano numa discoteca de Santo Tirso.
Às primeiras horas de 1994, quando começou o “Purple Rain” do Prince, uma música que eu sabia ser das preferidas dela, senti que os astros se tinham alinhado e que essa conjugação astral jogava a meu favor.
Ébrio, não me lembrei na altura que não acreditava nos astros. Sem pensar duas vezes, convidei a Mónica para dançar. Eu, que durante toda a minha vida pensava em tudo duas e três vezes, ali estava, corajoso. Era agora ou nunca.
Não fomos para a pista, ficámos ali, num canto, sozinhos. Ela encostou a cabeça ao meu peito e disse-me, “sinto o teu coração”. O alinhamento cósmico era total. Beijei-a e disse-lhe que a queria.

terça-feira, setembro 20, 2005

A Linha (parte I)

Era impossível não notar naquela figura ao cimo da escadaria. Talvez por estar a fazer um esforço por passar despercebido – estaria? -, mais do que propriamente pelo grande penso branco que tinha no nariz. Era evidente que tinha sido sovado.
Se atentássemos nos olhos daquele homem, não seria difícil perceber que procurava vingança. O facto de usar um chapéu de aba larga, mesmo por cima das sobrancelhas, acentuava-lhe os olhos raiados de sangue.
Agitou-se. O rosto permaneceu impassível mas os olhos fixaram-se em alguém. Percebeu-se que por baixo do comprido sobretudo que usava, se tinha mexido.
A sua espera tinha terminado. Observava agora um casal que se parecia despedir. Junto a eles um carro de bebé. Era só uma questão do momento certo surgir.

Grupos de barulhentos marinheiros circulavam por perto. O movimento era intenso. De repente, tudo se precipita. Um marinheiro grita e aponta para o cimo das escadas. O homem mantém o seu olhar petrificado mas agora move-se; de sobretudo aberto, empunha uma metralhadora. O homem do casal percebe o que vai acontecer, na sua ânsia de proteger a mulher e o bebé, faz o carro cair pelas escadas abaixo.

Mais homens armados parecem surgir do nada. Dezenas de pessoas correm em todas as direcções. O tiroteio é infernal. Trava-se uma batalha. A batalha final.

- Excuse me!!.
O anafado e carregado passageiro quase atropelou Luís. Não lhe acertou com a enorme mala que arrastava o mais depressa que conseguia, mas fê-lo regressar à realidade.
Aquele Excuse Me gritado aos seus ouvidos, fez desaparecer a figura de Elliot Ness que, de arma na mão, se preparava para enfrentar os homens de mão de Al Capone.

Union Station, Chicago. Ali, no meio da nave central da enorme estação ferroviária, era impossível não recordar a cena do tiroteio d’ “Os Intocáveis”, o filme de 1987 que Brian de Palma ali fimara e que conta a luta dos agentes do Departamento do Tesouro norte-americano contra o bando do famigerado mafioso.
Kevin Costner, Sean Connery, Andy Garcia e Robert de Niro tinham agora desaparecido entre a multidão e deu por si parado, no meio do grande átrio. Sentiu-se à deriva.

Era o primeiro dia de Primavera e estava muito calor. Olhando em volta, tudo lhe parecia decorrer muito lentamente, quase em câmara lenta. Até os ponteiros do enorme relógio que dominava o topo de uma das paredes do átrio parecia mover-se muito devagar. Aquela sensação de tempo dilatado perturbou-o.
Gordas gotas de suor escorriam-lhe pelas têmporas. Foi tomado por uma sensação de claustrofobia, como se as paredes estivessem a convergir sobre si. Teve de procurar onde se sentar.

Tinha acabado de chegar de Nova York no serviço Lakeshore Limited. Tinham sido mais de 18 horas de comboio.
Sabia à partida que tinha de estar preparado para aguentar muita coisa nesta sua viagem, mas aquela longa viagem tinha sido bastante penosa. Para além dos 110usd que lhe tinha custado o bilhete, estava agora a cobrar-lhe um outro preço, este bem mais elevado, o preço de uma noite muito mal dormida.

Tinha vindo para os Estados Unidos com o objectivo de deixar coisas para trás. Procurava nesta viagem, tantas vezes sonhada e outras tantas adiada, um novo começo. Queria reiniciar o computador interno. Novos programas tinham sido instalados e o reinício não podia ser feito no Porto.
Era-lhe por demais evidente que tinha de se afastar de certos locais, daquilo que eles lhe transmitiam. De certas pessoas também. Da simples possibilidade de se poder cruzar com elas. Só isso era suficiente para ter metido licença sem vencimento e partido quase de um dia para o outro.
Explicações não as deu. Às mil perguntas feitas por família e amigos, respondeu com evasivas. Apenas que era a altura certa para partir por uns tempos. Sabia que era mais que isso. À namorada tentou ser mais concreto, mais sincero. Não conseguiu.
Agora ali estava, a milhares de kilometros de casa. Num outro continente. Com um oceano entre ele e a sua vida. Precisava começar de novo mas ainda não tinha conseguido nada, apenas a sensação de que já tinha perdido algo.
Não ia ser fácil, estava bem consciente disso. A viagem até Chicago tinha sido uma prova disso. Apesar da secreta esperança que por vezes alimentava de que longe, as coisas começassem a ir ao sítio por si, as memórias tinham atravessado o Atlântico consigo.

Sentou-se numa cadeira que tinha num dos braços um pequeno ecran de tv. Era com certeza uma raridade, pensou. Em tempos, alguém se tinha preocupado com quem esperava pelo seu comboio. Agora, ninguém se tinha preocupado em tirar dali aquilo. É que nenhum televisor funcionava. Um pequeno autocolante envelhecido e à beira da queda, anunciava: out of order.
Havia uma fila de cadeiras que se estendia por uns 10 metros, cada uma com o seu pequeno receptor de tv. Apesar de nenhum funcionar, apenas o seu informava que estava out of order.
Naquela cadeira castanha e bastante maltratada, achou que poucas coisas ali estavam in order. Inclusivamente ele. Pensou em como seria bom conseguir dormir um pouco e fechou os olhos. A última coisa que viu foi o grande relógio no topo da parede. Marcava 9h55.

(NA: a cena do filme “Os Intocáveis” é retratada de memória, daquilo que me lembro daquela cena em particular. Não pretende ser um retrato fiel do que acontece. Apesar de alguma busca, não consegui encontrar a descrição da cena… e também não sou membro de nenhum clube de vídeo, o que inviabilizou o aluguer do filme).

sexta-feira, setembro 16, 2005

Música e Felicidade

Saiu há poucos dias em cd uma colectânea de música chamada “Som da Frente – 2º Volume”. O Som da Frente era um programa de rádio que fez história. Passava nas madrugadas da Rádio Comercial no final dos anos 80, início dos anos 90 e era responsabilidade do António Sérgio (que agora seleccionou as músicas dos 4 cd’s que constituem a referida colectânea). Terminou no verão de 1993 o programa e foi com grande pena que ouvi aquela última emissão.
Fez história porque foi um espaço privilegiado para descobrir coisas novas, para dar oportunidade a quem começava, de divulgação de sonoridades que não cabiam nos formatos então existentes no FM (e como as coisas pioraram entretanto). Foi a minha companhia em muitas noites.

Quando eu tinha 10 anos e passei para o 5º ano de escolaridade, calhou-me inaugurar uma escola. Pelas razões que todos nós bem conhecemos, a obra atrasou-se e o ano lectivo só começou em Janeiro!
Para meu azar, eu era dos (muito) poucos da minha zona que estava naquela escola. Ou seja, de Setembro a Janeiro, não tive com quem brincar. Tudo estava na escola menos eu. Tive que me entreter sozinho.
Estávamos no início dos anos 80, os computadores eram uma miragem, a TV começava às 18h00 e as Playstations eram ficção científica. Sobrava a rádio.
Comecei a ter nessa altura a música como companhia de eleição (quando terminei o 6º ano, tive de mudar novamente de escola; calhou-me nova inauguração, mas desta vez o ano lectivo começou em Novembro).
Como até ao 11º ano tive sempre o horário da manhã, muitas tardes eram passadas a ouvir rádio. A saudosa Rádio Comercial. Começava pela hora de almoço com a Discoteca e continuava com O Vapor e com o Rock em Stock. Eram estes os meus programas preferidos.
Foram pessoas como o Adelino Gonçalves e o Luís Filipe Barros os responsáveis pela minha “educação musical” (como é que se chamava o apresentador d’ O Vapor?).
Tive depois a felicidade de os meus pais me terem oferecido por essa altura uma aparelhagem, Sanyo, caríssima, que hoje parece uma coisa… bom, dos anos 80, mas que na altura me colocou na vanguarda da alta-fidelidade (pelo menos lá na minha rua). Gravar cassetes passou a ser o meu passatempo favorito (não consigo transmitir a mágoa que senti, anos depois, quando descobri que o passatempo favorito do meu irmão era gravar relatos de futebol nas minhas cassetes).

No 9º ano (engraçado como muitas coisas do nosso passado são referenciadas pelos anos lectivos), vieram para a minha turma três rapazes mais velhos, repetentes e “deportados” de outra escola, que só ouviam Heavy Metal. Passei a ouvir também e a gostar. Foi também nessa altura que começaram a surgir as rádios pirata. Às dúzias. Isto permitiu ter acesso a mais variedade musical. Para quem fosse curioso, o difícil era escolher o que ouvir.
Como não parecia bem a uma rádio pirata não ter, pelo menos, um programa semanal de Heavy Metal, muito barulho se ouvia lá por casa (com auscultadores, claro).
Um desses rapazes, o Samuel (que mais tarde veio a fundar a editora Música Alternativa), fazia parte de uma banda, os STS Paranoid (sendo que STS era de Satan Take our Souls… sim, que estas coisas eram a sério) e, como era letrista da banda mas pouco dado às coisas da língua inglesa, vinha ter comigo, que era desenrascado no inglês, para o ajudar nas rimas. “Oh pá, o que é que rima com blood? E como é que se diz desmembramento”?
Recordo com saudade essas aulas de matemática. Sim, que era durante as aulas de matemática que lhe dava para a poesia. Ele nunca quis fazer a disciplina e eu vim em queda livre dos 80% nos testes para uns míseros 50% que me deixaram safar à justa.

Durante uns anos afunilei um pouco musicalmente no Heavy. Foi a audição do Som da Frente (SF) que me abriu outra vez as portas para outros sons, a chamada “música alternativa”. Aqui deixo a minha vénia ao António Sérgio que, com programas como o Lança Chamas (LC) e SF, me apresentou alguma da melhor música que se fez (e faz, porque ele continuou com o Grande Delta na XFM e actualmente com A Hora do Lobo, na Comercial).
Novo flashback. Desta vez para a tarde chuvosa de um sábado de 1991 em que ouvi no LC o “Smells Like Teen Spirit” dos Nirvana pela primeira vez. Estava numa paragem de autocarro no centro da Amadora, ouvi no rádio do Walkman (eu sei que corro o risco de dar uma imagem de tolinho). Era algo diferente, novo. Lembro-me da aflição em tentar perceber o nome da banda, de não o ter conseguido, de ter ficado sem saber se eram os Teen Spirit, os Nirvana ou os Nevermind.
Há músicas assim, que quando as ouço são como um murro no estômago. Que me provocam um embrulhar de tripas.
Isto é difícil de explicar, é algo que se sente, que eu sinto, mas que não sei explicar.
Não sei explicar o que sinto quando ouço por exemplo, “A Letter to Elise” dos The Cure; a versão ao vivo do “Roads” dos Portished; “Made of Stone” dos Stone Roses; quando os ouço os sinos dobrar no tema “Summoning the Muse” dos Dead Can Dance; quando ouço “Tear in Your Hand” da Tori Amos ou os dois minutos do instrumental “Paris and Bond”, da banda sonora do filme Tomorrow Never Dies (música de David Arnold)… podia estar um dia inteiro nisto.

No outro dia, em resposta a uma afirmação minha, alguém me disse que não via qual a ligação entre música e felicidade.
Por não ser nem o local nem a ocasião as mais propícias, não dei seguimento à conversa, até porque aquilo que me veio à ideia responder, iria, por certo, causar alguma estupefacção.
Porque o que me veio à ideia responder foi que, não só eu achava que música e felicidade andavam de mão dada, como, no meu caso, de alguma maneira, a música me tinha salvo a vida: foi a minha companhia em muitos momentos; foi a minha fonte de pequenas alegrias; foi o meu escape; foi aquilo a que me agarrei; foi a corda pela qual subi.

Sim, consigo ver a ligação entre música e felicidade. Nitidamente. Se guardarmos uma música no coração, vai haver sempre esperança.

terça-feira, setembro 13, 2005

Comentários Obliterados

Vem a gerência deste Blog participar aos prezados leitores que as medidas anunciadas há poucos dias tiveram sucesso... pelo menos fora do sistema solar: Então não é que começou o Blog a receber comentários do planeta Spam?
Agora, por cada post publicado, recebemos comentários entusiásticos daquilo que nos pareceu ao início serem criaturas exóticas e amáveis: é que nos convidavam a visitar sítios longínquos e maravilhosos… se bem que estranhos. Parece que nesse planeta só existe comércio. E pouco variado, pois estão sempre a tentar vender produtos (naturais, é certo) que nos vão fazer maravilhas ao desempenho… er… sexual e aumentar o tamanho do… er… vocês sabem do que eu estou a falar.
Após um primeiro momento de entusiasmo, ficou a gerência um pouco aborrecida com este facto e decidiu actuar em conformidade. Assim, serão obliterados todos os comentários extraterrestres de índole comercial.

Bem hajam.

segunda-feira, setembro 12, 2005

A Boleia - 3ª e Última Parte

- Fica à vontade – disse Paula, desaparecendo por um pequeno corredor.
A sala estava pouco iluminada, um sensor tinha ligado a luz à sua entrada. A decoração revelava bom gosto. Todo o mobiliário privilegiava a simplicidade e a sofisticação. Duas grandes janelas permitiam ver parte da cidade e uma grande mancha escura não muito longe. Monsanto. Despiu o casaco que largou numa cadeira.
- Queres beber alguma coisa? – perguntou ela do local onde estava, sem se deixar ver.
- Na verdade, o que me apetecia mesmo era água.
Silêncio.
Apareceu pouco depois, já sem casaco. Trazia um copo de água e uma base que colocou numa pequena mesa, em frente ao sofá. A base tinha a foto de um farol e, escrito a verde, The Lizard Peninsula.
- Talvez seja da cerveja que bebi ao jantar, o álcool seca-me um pouco a garganta.
- Oh, pensava que era eu que te provocava essa secura.

Ele tinha as palmas das mãos húmidas. O ritmo cardíaco disparou. Sentiu mais uma súbita subida de temperatura.
Paula aproximou-se, tirou-lhe o copo da mão e posou-o na mesa, fora da base.
- Eu sei que mexo muito contigo – disse, usando um tom de voz que soou apenas como um sussurro; como se lhe estivesse a falar ao ouvido.
Ia dizer qualquer coisa, mas Paula colocou-lhe o indicador direito nos lábios. – Não digas nada.
Passou-lhe o dedo pelo queixo, foi-o baixando pelo pescoço, colarinho e deteve-o na gravata, pouco antes do local onde o externo termina. Fez uma perpendicular para a direita e colocou o dedo no mamilo.
Ambos tinham acompanhado aquele lento movimento do dedo com o olhar. Aquela unha arranjada, pintada de vermelho escuro, estava a fazer efeito nele.
Ao descrever um circulo à volta do mamilo, ela olhou-o nos olhos. Enfrentou-a. Já não o intimidava, apenas a queria possuir. E muito.
Paula apertou-lhe o mamilo entre o polegar e o indicador e mordeu o seu próprio lábio. Ele semi-cerrou os olhos e abriu ligeiramente a boca, deixando escapar um “ahh” abafado.
Continuavam a fitar-se, mas ele agora parecia não vê-la, apenas a sentia.
Ajudou-o a tirar a gravata e a despir a camisa.
Aproximou os seus lábios aos dele, tocando-lhes ao de leve. Tocou-lhes com a língua. O corpo dele foi percorrido como que por uma descarga eléctrica que o fez estremecer de alto a baixo. Beijaram-se. Ela continuava a apertar-lhe o mamilo.
Até então ele tinha mantido as mãos ao longo do corpo, sem vida, impassíveis, numa postura rígida. Aquele beijo como que o despertou. Toda a rigidez do corpo se concentrou no seu sexo. Colocou as mãos na cintura dela e puxou-a para si.
Ela afastou um pouco a cabeça para trás e com a mão esquerda afagou-lhe a face. – Quero-te muito.
As línguas entrechocaram-se novamente com sofreguidão. Ela passou-lhe uma mão pela nuca, revoltando-lhe o cabelo e colocou a outra nas nádegas, apertando-o. Soltou a sua boca da dela e procurou-lhe o pescoço. Separaram-se por momentos. Ela ofegava, o peito movimentando-se contra o dele. Fitava-o. Incitava-o com o olhar.
Puxou-a de novo para si e beijou-a no pescoço. Percorreu a distância entre o ombro e a orelha dela com a língua, mordiscou-lhe o lóbulo.
Tinha agora uma mão por baixo do cabelo dela, junto à face a com a outra sentia o peito dela, por cima da camisa. Sentia-a arfar junto do seu ouvido, soltar pequenos gemidos de prazer.
Com um movimento rápido, passou-lhe as mãos para a cintura e fê-la rodar, colocando-a de costas para si. Instintivamente, ela tentou voltar à posição inicial. – Não, fica assim – pediu ele.
Durante alguns segundos não lhe tocou, deixando-se ficar a contemplar o corpo dela mexendo-se ao ritmo da sua respiração, a apreciar o desenho das suas costas, os pequenos sinais que ela tinha. A sentir o seu cheiro.
Encostou-se a ela e colocou-lhe uma mão na barriga e a outra por cima do peito. Paula sentiu o sexo dele, duro.
- Eu quero isso.
- É teu.
Beijou-lhe novamente o pescoço, agora do outro lado. Ela deixou descair a cabeça ligeiramente para trás, num gesto de entrega total. – Adoro isso.
Tirou-lhe a camisa para fora da saia e começou a desabotoa-la, sem nunca parar de a beijar. A camisa de cetim encarnado caiu a seus pés, revelando um soutien também encarnado.
Ela pegou-lhe nas mãos e colocou-as por cima do soutien. Sentiu-lhe os mamilos duros.
Beijava-lhe agora as costas, fazendo-a arrepiar-se à medida que lhe ia passando a língua ao longo da coluna. Abriu-lhe o fecho da saia que caiu após um ligeiro movimento de ancas de Paula.
- És tão bonita.
Contemplava-lhe o rabo que o fio dental deixava ver na totalidade. Usava meias de vidro pretas que terminavam nas coxas.
Passou-lhe as mãos pelas pernas, por cima das meias e pelo rabo. Subiu de novo e desapertou-lhe o soutien. Devagar, muito devagar, deixando-a algo impaciente. Aquela falta de controlo que sentia, ao tê-lo atrás dela, sem o ver, sem lhe poder tocar como queria, desesperava-a um pouco mas, acima de tudo, excitava-a muito.
Ele parecia saber algo que ela não conhecia; algo que ainda não lhe tinha sido revelado. Apesar de, aparentemente, ser ela quem teria algo a ensinar, os papéis estavam invertidos. Ela sempre tinha desconfiado disso.
Apesar do pouco contacto que tinha com aquele colega, havia algo na presença dele, na maneira como a olhava - e que ela fingia não notar -, que lhe dizia que aquele homem lhe poderia mostrar algo de novo sobre si própria, proporcionar-lhe novas sensações.
Não se tinha enganado.

Deixou que ele lhe baixasse as cuecas e deu dois passos. Virou-se e adoptou uma pose de forcado antecipando a investida do animal. Sorriu-lhe.
Aproximou-se dela, sem pressa. Demonstrava segurança absoluta. Apesar de todos os seus medos e inseguranças, ali, naquele momento, nada disso existia; sabia o que queria e o que fazer.
Pegou-lhe na mão. – Vem. Levou-a para o sofá onde a deitou.
Beijou-lhe os lábios, o queixo, o pescoço, os ombros, o peito, as mamas. Paula gemia. Agarrada com uma mão ao cabelo dele a ao sofá com a outra, contorcia-se com a antecipação. De olhos cerrados, pedia mais.
Beijou-a na barriga, meteu-lhe a língua no umbigo. Passou-lhe as mãos pelas coxas. Estava agora entre as pernas dela que por vezes o apertavam, outras se afastavam, esperando-o, convidando-o a entrar.
- Quero-te… fode-me…
- Ainda não…

Com a língua afastou-lhe os grandes lábios, tocou-lhe ao de leve, apenas com a ponta no clitóris, o que fez Paula arrepiar-se de prazer. – Carlos…
Ele hesitou. Levantou a cabeça e viu o rosto de Paula iluminado. Era evidente o prazer que sentia. A entrega era total.
Avançou com a mão direita para as mamas dela, apertando-lhes ligeiramente os mamilos. Concentrou-se de novo no sexo dela, lambendo-o, devagar, sentindo o gosto dela, contrariando a vontade que lhe sentia em ser penetrada.
- Carlos… por favor…
- Não – respondeu-lhe ele com voz ofegante mas calma -, quero que te venhas primeiro…
Paula ergueu o corpo numa contracção, ficando apenas apoiada nos pés e omoplatas.
Avançando com a mão, ele colocou o indicador e o dedo médio nos lábios de Paula, que os sorveu, chupando-os.
Percorrendo o corpo de Paula no sentido inverso com os dois dedos juntos, foi misturando a saliva com o suor do corpo dela.
Penetrou-a lentamente com eles ao mesmo tempo que lhe lambia e chupava o clitóris.
Agarrada ao sofá, Paula sentia um tremor percorrer-lhe o corpo. Tinha pequenas convulsões de prazer e não demorou a sentir um orgasmo a subir pelas suas entranhas. Empurrou-se contra a mão dele.
- Venho-me…
Continuando os movimentos compassados com que a ia penetrando, subiu até perto dela e segredou-lhe: - Vem-te na minha mão. E beijou-a.
Paula ergueu-se novamente, agarrou-se ao braço dele, soltou uma longo gemido e deixou-se cair, de olhos fechados, mordendo o lábio. Arfava.

Demorou um pouco a recompor-se. Ele ficou ao seu lado, a olha-la. Só agora reparava nas pequenas sardas que tinha nas maçãs do rosto. Num sinal por cima do lábio. Beijou-a ternamente. Achava-a muito bonita.
Afastou-lhe alguns cabelos da testa e com isso como que a despertou.
- Agora é a minha vez – disse-lhe ela sorrindo enquanto se sentava em cima dele. Passou-lhe as mãos pelo peito, usou as unhas para lhe fazer sulcos na pele.
Com ele sentado no sofá, Paula deixou-se escorregar pelas suas pernas abaixo. Sentiu o sexo dele com a mão por cima das calças. Lentamente, desapertou-lhe o cinto, fitando-o, provocando-o. Percebia a vontade que ele tinha de libertar o sexo e brincava com isso.
- Paula, não sejas assim…
- Assim como?
- Tem piedade…
- Ah, afinal o menino também sofre…
Descalçou-o e tirou-lhe as calças, deixando-o de boxers. O volume era notório. Acariciou-o. Ergueu-se e beijou-lhe os mamilos ao mesmo tempo que desabotoava o botão dos boxers. Introduziu a mão, movimentando-a ritmadamente. No momento em que ele ia soltar um grito de prazer, não o deixou dizer nada, colando os seus lábios aos dele.
Beijou-o seguidamente nas virilhas, o que o fez esticar o tronco e ficar com pele de galinha. Sem esperar, Paula passou a língua pelo sexo dele. Com uma mão nos testículos, abocanhou-o, apertando-o com os lábios.
Ele contorceu-se sem conseguir controlar o movimento. Ela sorria, enquanto o masturbava. Sugou-o de novo. Passava-lhe a ponta da língua de alto a baixo e depois fazia-o desaparecer dentro de si, o que o forçou a puxá-la para si. Não queria perder o controlo.
Paula sentou-se de novo ao seu colo. Com os joelhos apoiados no sofá e as mãos nos ombros, Paula deixou-se penetrar. Baixando-se lentamente, sentia cada milímetro dele a entrar em si. Abraçou-o. Tinha descoberto uma pequena cova na curva que ligava o pescoço ao ombro e o efeito que provocava nele quando lá passava a língua. Atacou esse ponto fraco.
Os corpos suados movimentavam-se ao mesmo ritmo. Como um só. As mãos eram usadas para sentir a vibração do corpo do parceiro, para traçar um mapa de cada curva, de cada local de maior prazer. Estavam ambos dominados por sensações absolutas. Cada estremecimento de um era acompanhado por um estremecer do outro.
Após algum tempo, pegou-lhe ao colo e, sem se separar dela, deitou-a no sofá. Colocou-lhe as mãos no rabo e, elevando-a ligeiramente, continuou a possui-la assim.
Paula, que até então tinha estado agarrada ao sofá, ergueu uma mão na direcção dele. Puxando-o para si. Ele beijou-lhe os mamilos. Novamente corpo contra corpo bastou uma troca de olhares para ambos saberem. Beijaram-se.

Observava-a há já largos minutos, a dormir tranquilamente, virada para si. Beijou-lhe o ombro, deixou a cama e vestiu-se. Tinha reparado que ela deixara as chaves de casa numa pequena mesa junto à entrada. Tinha tido uma ideia. Saiu.
Num pequeno jardim em frente apanhou um malmequer.

Retirou uma folha de um bloco que estava junto ao telefone e voltou ao quarto. Paula continuava a dormir, serena.
Escreveu apenas o seu número de telemóvel. Ia assinar mas, no momento em que encostou a caneta ao papel, deteve-se. Colocou o malmequer e o papel na sua almofada e deixou o apartamento.

Era cedo. O sol não tinha ainda rompido a névoa daquele início de dia. Arrepiou-se.
Ao caminhar para o carro tinha um sorriso estampado no rosto.
João era um homem feliz.



sexta-feira, setembro 09, 2005

A Boleia - 2ª Parte

Conseguiu controlar-se fisicamente mas mentalmente estava todo desarticulado. Enquanto o computador desligava, tentou organizar as ideias. Repetia para si próprio que não era razão para tanto.
A sua relação com as mulheres tinha sido sempre algo complicada. A sua falta de confiança nunca lhe tinha permitido afirmar-se. Esta noite estava determinado a não deixar que isso lhe acontecesse.
Mal tinha pensado nisso, lembrou-se de que apenas ia dar boleia a uma colega, não se tratava propriamente de um encontro, de uma saída a dois.
- Foda-se, descontrai-te, pá - disse alto.
Ficou paralisado. Teria ela ouvido? Teve a sensação que ela estava à porta, a olhá-lo. Teve receio de erguer os olhos e de a ver. Olhou e ela não estava lá. Abanou a cabeça e respirou fundo.

Paula estava de pé, a olhar pela janela para o rio. Parecia ausente, com o olhar perdido na escuridão das águas.
Parado à porta, ele viu o seu reflexo na janela. Era muito pequeno ao lado dela, ali reflectido na janela.
- Pronta?
- Sim, vamos.
Paula desligou a luz, accionou o alarme e fechou a porta blindada do escritório. Quando o elevador chegou e a porta se abriu, apareceram os dois reflectidos no espelho. Agora do mesmo tamanho. Na mente dele aquele momento ficou gravado como uma fotografia, ela como seu ar impenetrável, ele com o seu sorriso afectado.
O gesto de Paula a carregar no botão do piso 0, funcionou como um clarificador de ideias para ele. Afastou todos os pensamentos pessimistas e sentiu-se confiante. Estranhamente confiante.

Não queria, mas era mais forte que ele. Apesar de estar a fazer um esforço por fazer conversa de circunstância, só pensava na saia justa de Paula, naqueles saltos altos, nos lábios dela. Fez um esforço por se controlar, mas não foi capaz de dizer nada.
O chão da entrada do moderno edifício de escritórios era de mármore. O som que cada passo dela fazia penetrava-lhe a mente como uma baioneta incandescente, aquele som característico dos saltos contra a pedra como que falava com ele, cada passo soava-lhe a S – E – X – O. Não conseguiu evitar uma erecção. Também a cara lhe ferveu.
O segurança abriu-lhes a porta e cumprimentou-os.

Apesar daquele momento de “fraqueza” (pois era assim que ele via a erecção que não conseguiu evitar), estava algo espantado consigo próprio. O tumulto interno estava em grande medida dominado e estava concentrado, não sentia agora aqueles nervos que o impediam de raciocinar, que lhe tolhiam a acção.
Destrancou as portas com o comando à distância e abriu-lhe a porta. O movimento dela a sentar-se abalou-o. Tinha de disfarçar aquela erecção a todo o custo.
Como ela mexia com ele. Podia contar pelos dedos de uma mão as mulheres que lhe tinham provocado aquele tipo de erecções. Erecções ponta-e-mola, como lhe chamava. Não era uma coisa que se fosse manifestando aos poucos, que fosse “crescendo”. Não, nestes casos, com aquelas mulheres, era do oito ao oitenta em 2 segundos. Bastava um gesto, um movimento das pernas, um jeito com a cabeça, um olhar. Pequenas coisas para a maioria, mas que para ele se tornavam em algo verdadeiramente extraordinário, inexplicável, mas muito presente, muito forte.
Lembrou-se do constrangimento em que se tinha visto há uns meses, quando no café onde estava com colegas, depois de almoço, ela passou pela mesa onde estavam. Daquilo que sentiu, da tesão que lhe tinha dado. De os colegas se terem levantado “para aproveitar a boleia” dela de volta ao escritório e ele ter de inventar uma desculpa esfarrapada para não ir. Não se podia levantar. Ia-se perceber. Pediu a um colega para lhe ir comprar uma água com gás, estava indisposto…
Agora ali estava, com ela, no seu carro. O som das meias quando ela roçava as pernas uma na outra.
Ia ser uma viagem difícil até casa dela, pensou. Olhou para ela e sorriu, ela devolveu-lhe um sorriso de circunstância.
Conseguiu fazer conversa durante o caminho: como estava bonita a noite; como gostava de conduzir na cidade à noite, com pouco trânsito e longe das confusões de uma sexta à noite; a música que ia passando no rádio. Ela foi sempre respondendo de uma maneira simpática mas sem nunca ser expansiva. Não ficou a saber mais nada sobre ela.

Paula morava em Benfica, no edifício do Centro Comercial Fonte Nova. Parou à entrada, “eu abro-lhe a porta”. Ao sair, olhou para baixo e pensou “porta-te bem, não me deixes ficar mal”… pelo sim, pelo não, contornou o carro pela traseira.
O movimento dela a sair do carro pareceu-lhe de uma elegância extrema, mas não teve que se preocupar com as possíveis consequências, ela fitou-o e disse - Estaciona, sobe.
Sem esperar por resposta, ajeitou a saia e seguiu para a entrada do prédio.
Todo o sangue que lhe afluía ao sexo, fez uma imediata inversão de sentido e disparou na direcção da cabeça. Sentiu uma tontura. Sentiu a cara a ficar quente, as orelhas. A pizza pareceu revoltar-se no estômago, sentiu um nó nas tripas. Algumas gotas de suor frio perlaram-lhe a testa.
Amaldiçoou-se. Era um homem ponta-e-mola. Tantas reacções em tão pouco tempo, instantâneas. Aquela mulher mexia mesmo muito com ele.
Conseguiu algum domínio sobre as suas emoções, sobre o seu raciocínio. Era só um convite para subir, nada mais. Possivelmente queria discutir alguma coisa de trabalho.

Felizmente havia um local para estacionar perto. Desligou o carro, baixou a pala e olhou-se ao espelho, “coragem rapaz”. Limpou o suor com um kleenex e saiu.
Paula aguardava-o à entrada do prédio, na parte interior. Apesar de ele ter demorado um pouco, não parecia impaciente. Era como se soubesse aquilo por que ele estava a passar.
Ele ainda pensou em dizer algo, mas limitou-se a sorrir. Mais uma vez ela devolveu-lhe o sorriso, mas desta vez pareceu-lhe um sorriso divertido, não apenas um sorriso de circunstância.
Entraram no elevador. Ela carregou no botão do 8º andar e olhou-se ao espelho. Ele não sabia o que pensar daquele silêncio dela, não facilitava nada aquela mulher. Sabia que devia dizer alguma coisa, mas tinha a garganta seca demais para falar.
Paula tinha todo o ar de saber o que fazer na cama e de ser muito exigente mas, ao mesmo tempo, de ser muito compensadora. Por mais que não quisesse, era nisso que ele estava a pensar.

- Chegámos – disse ela, abrindo a porta do elevador.
Sentiu o perfume dela e teve nova erecção.


quinta-feira, setembro 08, 2005

A Boleia - 1ª Parte

Profissionalmente, era a pior altura do ano. Gostava do que fazia e da empresa onde trabalhava. Pela primeira vez em muitos anos de desacerto, tinha conseguido um bom lugar e logo numa empresa com bom ambiente de trabalho.
Mas as semanas que antecediam a data de conclusão do orçamento para o ano fiscal seguinte, era sempre uma altura de algum stress e que, por vezes, obrigavam a horário prolongado.
Era o que acontecia naquela sexta-feira. Para evitar ter de vir trabalhar no fim-de-semana, tinha optado por ficar até mais tarde.
A próxima quarta-feira era a data limite para entrega da previsão de custos do seu departamento e queria concluir essa tarefa o mais cedo possível.
Segunda e terça seriam apenas dias de revisão dos números. E também de um certo gozo. Gozo em apreciar a aflição dos responsáveis pelos outros departamentos, à medida que a data limite se aproximava e que não tinham a sua parte feita. Sentir a tensão nervosa – certamente por não ser a dele; ele, que tanta coisa deixava nervoso.
Nunca contava a ninguém que já tinha a sua parte pronta há vários dias, nem mesmo aos colegas com quem tinha uma relação mais próxima. Fingia sempre estar também pelos cabelos com o orçamento, dizia frequentemente que o dia devia ter 30 horas. Apesar de ter tudo pronto com antecedência, só entregava a sua parte no último momento, não fosse a administração no ano seguinte reduzir o prazo para a elaboração do mapa.
O nervosismo geral era tanto entre os colegas que nunca ninguém tinha reparado que, ao contrário deles, ele não fazia directas naqueles últimos dias.

Estava quase a dar por concluído o dia. Olhou para o relógio do computador, 23h05. Afastou a cadeira da mesa para se espreguiçar mas esta bateu em algo. Era a caixa de pizza que tinha encomendado para o jantar. Sentiu o gosto do sal nos lábios e tomou nota de um apontamento mental, “cortar nas alcaparras”.
Foi buscar água à máquina no corredor. Enquanto enchia o copo ouviu vozes. Afinal não estava sozinho, pensou. Afinal não era ele o único a querer despachar-se este ano, mais alguém abdicava de uma noite de sexta para dar um avanço ao orçamento. Quem seria?
Era uma voz feminina. Avançou um pouco mais e percebeu quem era: a secretária do “grande-chefe”, como por vezes chamava ao administrador. Hesitou. Ela era uma das coisas que o deixava nervoso.
Tinha mais 10 anos que ele. Já nos quarentas, era aquilo a que, muito resumidamente como só os homens sabem ser em relação a certos assuntos, se costumava chamar uma “gaja boa”. Ele não podia concordar mais.
Ao certo, ninguém sabia a sua idade. Aliás, pouco se sabia sobre a sua vida apesar de ser um tema algo frequente entre os colegas homens. Salvo melhor opinião, tinha-se por ser uma pessoa dedicada ao trabalho e ao ginásio – sim, que para ter um corpo daqueles era preciso dedicação ao ginásio.
Relações não lhe eram conhecidas e quem tinha tido “tomates” para a convidar para sair, tinha sempre trazido uma nega para contar aos amigos. Havia mesmo apostas feitas sobre quem seria o primeiro a conseguir sair com ela.
Entre os colegas era conhecida como “o bloco de gelo”, colegas homens e mulheres.
Paula Varela, o bloco de gelo. Aquela mulher tinha o dom de o tirar do sério. Não conseguia evitar ficar perturbado na sua presença. Na verdade, bastava pensar nela. Dava-lhe tesão. Soltava-lhe a imaginação. Entretinha-se algumas vezes - mais do que as que gostava de admitir a si próprio - a somar algumas características de Paula: secretária, aquele ar frio e distante, aquelas saias justas, aquelas pernas bem torneadas, aquele cabelo negro, os olhos castanho claros, os óculos Armani que lhe davam um ar ainda mais sofisticado, os saltos altos que insistia em usar (só para o torturar, estava ele convencido).
Não era muito, mas para ele era o suficiente para lhe dar muita tesão e fazê-lo sonhar acordado.

Agora, ali estava, à porta do gabinete do “grande-chefe”, sem se deixar ver, a ouvi-la falar com a mãe ao telefone. Estava a cancelar o pequeno-almoço que tinham combinado para o dia seguinte; tinha ficado a trabalhar até aquelas horas, ia chamar um táxi e ia para casa descansar sem ter de se preocupar com compromissos no dia seguinte, para mais, logo cedo. O pequeno-almoço teria de ficar para domingo.
Um pensamento súbito fê-lo estremecer: oferecer-lhe boleia até casa. Achou imediatamente a ideia absurda, ela nunca lhe tinha sequer dado confiança, nunca tinham tido uma conversa para além de assuntos de trabalho e, mesmo assim, sempre conversas breves.
Voltou para trás. Deu meia dúzia de passos e parou. “Que diabo, o pior que me pode acontecer é levar uma nega, não a vou convidar para sair, faço-me de surpreendido em a ver aqui a esta hora e ofereço-lhe boleia”.
Nunca tinha sido homem para grandes rasgos de coragem, especialmente quando se tratava de mulheres mas, naquele momento e até por ser algo inesperado, em que não tinha pensado com antecedência, sentiu a confiança necessária para tentar a sua sorte. Respirou fundo e deu meia volta.
Espreitou pela porta. – Ah, olá, boa noite… fui buscar água, vi luz, pensava que estava sozinho…”
- Olá – disse ela naquele tom distante, como só ela sabia fazer e que deixava toda a gente em sentido,– tive que ficar até mais tarde, mas o Dr. Já saiu e eu vou sair não tarda nada também. É só chamar um táxi.
A ele, pareceu que Paula nem olhou na sua direcção. Vacilou. Tinha avançado mas agora hesitava em fazer o convite. Os pensamentos entrechocavam-se na sua cabeça.
- Eu também fiquei… a adiantar algumas coisas para o orçamento. Mas também vou sair – bebericou um pouco de água - , se quiser eu posso dar-lhe boleia até casa, não me importo…
“Agora está feito, seja o que Deus quiser”, pensou.
Durante o que lhe pareceu ser uma eternidade, mas que na verdade tinham sido apenas breves segundos, ficou ali, à entrada da porta, como que suspenso, a segurar o copo de água com as duas mãos, nó da gravata descaído, botão do colarinho desapertado, cabelo em desalinho e um sorriso um pouco parolo. Se se tivesse visto, por certo teria tido vontade de se enfiar num buraco bem fundo e de só voltar anos depois.
Paula levantou a cabeça e olhou-o com um olhar penetrante, não distante como era habitual. Aqueles dois pontos castanho claros a fitarem-no por detrás das lentes fizeram-no engolir em seco.
- Está bem, agradeço. Quando sai?
- É só desligar o computador. Já tinha mesmo terminado. Podemos sair daqui a nada.
- Eu espero-o aqui, então.
- Volto já – disse ele, tentando reunir todas as suas forças nas pernas para que não o deixassem ficar mal. Receou que a ordem de movimento dada pelo cérebro não fosse obedecida.
Mas foi.

quarta-feira, setembro 07, 2005

Blog Em Órbita

Depois de consultar a mais recente lista de audiências de Blogs e ter constatado que este onde vos escrevo não faz parte do top 500.000, decidiu a gerência tomar algumas medidas.
Antes de mais, quer a gerência muito agradecer aos 5 leitores habituais a fidelidade e paciência demonstrada e informar que as ameaças feitas à integridade física dos familiares para vos obrigar a visitar o Blog, deixam de estar em vigor.
Não acredita a gerência em tácticas clandestinas para entrar no top 500.00. Antes, decidiu pôr em prática um conjunto de ideias luminosas inspiradas na leitura de um clássico: “Marketing Para Totós”.
Assim, passamos a partilhar com os estimados leitores (todos os 5), algumas dessas medidas – algumas das quais verdadeiramente inovadoras e nunca antes tentadas neste fantástico mundo dos Blogs (apesar da consciência de que ter um Blog é tão 2004).

À semelhança de alguns clubes de futebol (cujos lideres, por certo, também leram o clássico de que vos falava à pouco), vai esta gerência encetar conversações com várias multinacionais no sentido de concessionar o nome do Blog por um período mais ou menos longo de tempo. Parece que já estou a ver, “MalefíciosdaCocaCola”… bom, é uma ideia ainda a necessitar de alguns ajustes.
Consciente de que o mundo do futebol arrasta multidões e suscita muito interesse, mais duas medidas estão a ser pensadas com o intuito de provocar a curiosidade das pessoas sobre este Blog.
Uma dessas medidas vai ser mandar instalar em vários campos de futebol umas faixas a dizer “John 3.16 lê Maleficiosdafelicidade”; outra será mandar distribuir nos estádios cachecóis com os dizeres “Graças a Deus Leio o Maleficiosdafelicidade”. Pagam-se umas entradas a uns quantos maluquinhos da bola nos jogos com transmissão televisiva e deixa-se que a tv faça o resto (está a ser estudada uma terceira possibilidade, que é pagar a um tipo que faça uma invasão de campo, todo nu, com o site tatuado nas costas… mas não vai ser fácil encontrar um tipo com umas costas tão largas).
Uma outra medida que se prevê de grande impacto é a criação de um mail com uma daquelas muito apreciadas mensagem-corrente, em que se dirá a quem a receber que se não for ao link fornecido (o Blog, claro), e não passar o mail a pelo menos 20 pessoas, várias maleitas, maus-olhados, infortúnios, desgraças e azares passarão a ser uma constante nas suas vidas. Ao contrário, a ida ao Blog 3 vezes por semana proporcionará uma maré de sorte e felicidade nunca antes vista: contar-se-ão casos de pessoas a quem saiu o Euromilhões, que encontraram o amor, que deixaram cadeiras de rodas, etc.

Ao nível da temática abordada também haverá mudanças. Vão passar a ser referidos temas mais susceptíveis de causar polémica, coisa que, é por demais sabido, aguça o interesse das pessoas. Não se admirem, portanto, que se comece por aqui a falar com alguma insistência em sexo. Muito sexo. Sexo assim, sexo assado, sexo de manhã, à tarde, à noite e nos entretantos. Também se começará a falar das novelas da TVI.. e do jet-set, quem vestiu o quê, quem anda com quem…

É claro que se podiam tomar outras medias, como mandar estampar umas t-shirt’s, pagar uns anúncios nos jornais, etc, mas tudo isso está mais que visto, não é original e esta gerência leu o capitulo 12 (“seja diferente”) com particular atenção e gosto. Originalidade é fundamental.
Isto, aliado a uma outra característica desta gerência, que é pensar em grande, levou a tomar uma última medida, esta bem mais arrojada: sendo este um Blog de tão grande qualidade e evidente recorte literário, porquê limitá-lo ao planeta Terra? Porque não dar-lhe uma dimensão verdadeiramente universal, torná-lo representante do melhor que a espécie humana é capaz?
Se bem o pensou, melhor a gerência o fez e, assim, é com uma pontinha indisfarçada de orgulho mal contido que se anuncia o envio deste Blog para o espaço. Literalmente.
Disponibilizado pela MindComet, este serviço de envio de Blogs para o espaço vai ser usado por nós. Et’s, preparem-se! (www.bloginspace.com)

Seguros do sucesso destas medidas, não quer a gerência deixar de manifestar, mais uma vez, junto dos 5 leitores habituais, a vontade de que participem neste esforço publicitário, falando do Blog às pessoas que em vós confiam – podem mesmo falar dele às pessoas que desconfiam de vocês, que a gerência não se importa.

God Speed.

quinta-feira, setembro 01, 2005

Enquanto Estive Fora - A Sul

Fui ao Algarve pela primeira vez com 5 anos e desde então só não voltei lá um ano. Inclusivamente, já lá vivi. Conheço-o de uma ponta à outra, literalmente. Uns sítios melhor que outros, claro, mas conheço-o bem.
Fiz, portanto, o caminho para sul centenas de vezes. Muito desesperei eu naquela estrada. O suplicio que era.
Sempre me pareceu um flagrante exemplo do atraso do país, não haver uma auto-estrada para o Algarve, para mais, sendo o local de férias de milhares de pessoas, nacionais e estrangeiras. Há 10 anos a A2 terminava em Setúbal, a 42 kms de Lisboa!
Mas agora já há auto-estrada e a viagem tornou-se mais cómoda e segura… e cara: Lisboa – Algarve 17€, mas isso é outro assunto.

Este ano fui para a zona de Vilamoura, onde não ia há alguns anos. Fui para um sitio com um nome pomposo: um Country Club, o que é muito bem.
Desconfio sempre destes nomes em inglês. Lá chegado pude constatar isso mesmo, de Club não vi sinal e do Country também não – não me parece que algumas árvores e relva justifiquem o nome.
Este Country Club não passa de alguma Villas equipadas com uma pequena cozinha e, portanto, não disponibiliza serviços de restauração, ou seja, ou se come sempre fora ou se vai às compras. Ainda mal cheguei e já estou no Alisuper de Vilamoura!
Bolas que a inflação aqui é superior ao resto do país. E sazonal, dizem-me. Mais uns dias e baixa.
Arrumadas as compras, piscina, que já tenho saudades do cloro.
De regresso a “casa” (deixem-me chamar-lhe assim para facilitar), formigas tomaram de assalto a cozinha, estão por todo lado às centenas. Percebi então: estava no campo, Country Club, batia certo.

À noite fui a Vilamoura propriamente dita, downtown. Nunca percebi o encanto da terra. De onde vem o proveito, a fama? O que é que as pessoas vêem ali? Eu confesso que vejo pouco. Não me parece muito diferente de Quarteira. Tem um Casino, tem bons hotéis, uma Marina e, de facto, vêem-se por lá mais pessoas saudáveis, melhores carros, mas isso é o efeito, eu interrogo-me quanto à causa, a origem de tudo. Não tem praias diferentes das outras, não tem microclima, não tem paisagens particulares… não sei.
Lá fui. Até à Marina, pois claro, fora isso não há muito mais para fazer/ver. Tudo a chinelar para a frente e para trás; os barcos (alguns arrestados); os restaurantes e bares (curioso como em frente ao bar do Figo o ajuntamento de pessoas era maior, estariam com esperanças de o ver na esplanada a beber uma caipirinha?), e está visto.
Vamos lá comer um gelado. Uma minibola de gelado 2€? Íamos. Não é sovinice, mas custa-me ser assaltado. Na praia a mesma coisa. Nos bares da praia da Falésia 1,5 lt de água, 3€, como se ali o ar fosse mais rico em oxigénio, como se a areia não tivesse beatas ou não se tivesse de deixar o carro no meio do matagal e longe (tem a sua piada ver um Porsche no meio do mato, ao lado do Fiat Uno).

Tirei um dia para ir à Manta Rota, que tem sido o meu local de destino nos últimos anos. Havia que matar saudades de uma feijoada de lingueirão.

Na noite seguinte fui a Albufeira. Gosto mais. A confusão é a mesma mas, ainda assim, há mais para ver, mais onde ir, mais animação. Deve também ter a ver com o facto de me ter divertido em Albufeira quando era mais novo. Gosto de regressar a certos sítios, recordar algumas noites bem passadas (vejo que tiraram o carro do Vegas, que a IRS é agora uma urbanização).
Numa segunda noite em Albufeira, jantei no restaurante “A Ruína”. Deve ser dos poucos restaurantes em que se pode comer desde o rés-do-chão (na praia), até ao telhado, passando por, salvo erro, 3 andares. Não percebi o nome, está tudo muito bem conservado e com apresentação.
A vista é muito bonita. Praticamente só se come peixe, o que, para um consumidor preferencial de carne, é óptimo. Menu não existe, vai-se a um balcão e escolhe-se lá. Tudo muito bem.
Depois veio a conta. Tudo mal! Uma mísera posta de bacalhau, 20€? Meia dúzia de amêijoas, 25€? (o grama de amêijoa deve estar em competição renhida com o de cocaína). E não é sovinice, repito, mas aperta-se-me o coração.
Foi então que percebi também o nome do restaurante: a ruína é do incauto que lá vai comer. Eles bem avisam, até se vê ao longe. Culpa minha.

Passou-se assim uma semana de férias: piscina, praia e passeios pelas redondezas (campos de golfe, imensos; mas não chegam, a junta metropolitana do Algarve aprovou por estes dias mais 50 campos!). Descansou-se menos, mas também foi bom.

No sábado jogou outra vez o Benfica. O tal jantar não vai mesmo ser no próximo ano.

Domingo estou de regresso. Reparo em duas coisas: como certas partes do Alentejo estão muito parecidas com desertos… assustadoramente parecidas; e nas marcas de travagens no asfalto.
Sempre me impressionaram muito aqueles riscos. Se falassem, as histórias trágicas que alguns contariam. Não posso deixar de reparar nas curvas desesperadas que fazem, na maneira abrupta como alguns terminam no separador central, na valeta.
Acho que um livro de fotos destas marcas poderia fazer algum sucesso numa campanha da Prevenção Rodoviária.

Lisboa. Desembrulhar a trouxa que amanhã começa tudo outra vez.