No estrangeiro tudo era bonito: havia casas grandes; carros lustrosos; as senhoras eram louras; os homens bonitos e sempre muito bem vestidos, de cabelo arranjado; havia muitas festas no estrangeiro. Aquilo sim, era vida. A vida que Arminda queria.
- Onde vais tu arranjar essas porcarias, rapariga?
- É a professora Adilia que as traz do Porto, mãe… já lhe tinha dito. – Sabia dar um tom convincente às mentiras que dizia, quando queria.
- Vou ter de conversar com essa professora, vou, vou… - ameaçava a mãe, mas Arminda sabia que ela nunca o faria.
- Larga isso e vai ajudar os teus primos a trazer as vacas, anda. Sempre a sonhar acordada. Ainda vai ser a tua perdição!
Uma vez tinham-lhe dito que era o “sexto sentido”. Não lhe adiantou muito, mas ficou a saber o que chamar aquela sensação.
À porta de casa, a ver a filha a caminho do campo, Francelina tentava resignar-se à ideia de que um dia a filha ia partir. Esta não nasceu para ficar quieta… sai ao pai.
Com mais cinco filhos a seu cargo, não foi difícil convencer José a deixar partir a filha. E Francelina foi. Contrariada. Arrancada do único sítio que conhecia.
Não lhe perguntaram se queria ir, mandaram-na só fazer a mala, no dia seguinte, bem cedo, iria para Chaves.
Mas enquanto não voltava, tratava da casa dos patrões e, um dia, ao iniciar o almoço, viu-se sem cebolas para o refogado. Saiu apressada para ir ao mercado. Sem que o soubesse, ia ao encontro do seu destino.
Ao longo da vida, muita espécie lhe fez a maneira como tudo aconteceu, primeiro a inesperada mudança para Chaves e, depois, como uma simples ida ao mercado lhe havia de mudar a vida. Passou a estar muito atenta às coisas simples e desconfiada em relação às inesperadas.
Em particular, aos homens.
Aquela voz soou-lhe como música. Ao virar-se, tendo o sol pela frente, apenas viu a silhueta dele. Era muito alto, a cabeça grande, a terminar num estranho triângulo. À medida que os olhos se foram habituando aquela luz, viu-lhe os olhos, muito claros, seriam azuis? Talvez verdes… o sorriso enorme, os lábios grossos, os dentes perfeitos.
O triângulo, percebeu depois, era um bivaque. Joaquim, assim era o seu nome, estava fardado. Soldado no Regimento de Infantaria de Chaves, era um Lisboeta de Alfama, ali colocado como castigo por insubordinação em Mafra.
Detentor do charme característico dos malandros, Joaquim tinha decidido que aquela sopeira tímida e encolhida com quem se cruzou havia de ser sua… e estava habituado a ter o que queria, no que dizia respeito a mulheres.
Apesar de algumas vigorosas negas dela, acabou por a acompanhar a casa. Na tarde do domingo seguinte, única altura em que ela tinha algum tempo livre, esperou-a à porta para irem passear.
Em menos de um mês, Francelina tinha sido sua.
22 comentários:
Gosto da tua escrita.
rui... excelente,
O ambiente do campo, o ir servir, ser soupeira, o lisboeta (tinha que ser) marialva...
aguardo o III
cumprimentos monárquicos
Este magalas de Lisboa é sempre a mesma coisa. Sempre a tentar levar as moças para o mau caminho.
A Arminda é filha do Joaquim???
Espero III Parte, tou a gostar muito :-) Bjs. Jaqui
uma familia com as suas curiosas particularidades...
veremos como vai evoluir a relação do malandro com a donzela!
BJ ;)
Esses magalas sacanas... limpava tudo o que eram sopeiras, mas a nossa protagonista é mais esperta e não vai ser com certeza levada na conversa de um qualquer.
Em menos de um mês..vá lá, ela até se sgurou benzinho ;)Excelente texto Rui :) Beijinhos
Bonito conto Rui. Isto promete a singeleza da Francelina e a rebeldia da Arminda. Fiquei com um sorrisinho nos lábios....
beijocas, fico a espera de mais....
Porque será que as mulheres tem sempre de se apaixonar por homens destes??Porque não podem gostar de rapazes, sérios, bondosos, honestos....mas não tem de ser sempre pelo chico esperto!!
Estou a gostar muito...continua!!!
Rui, que bem construida!
Parece que são palpáveis!
Quero mais :)
Palavras para quê...
I'm waiting for the third part :-D
Bjnhs
Está decidido... Em vez de andar sempre com um livro na carteira, para os "tempos mortos"... Passo a imprimir os teus posts para ler :) Bem mais leve e cativante!
Muitos beijinhos!
como podes ver pelas horas, já é Madrugada...só venho aletar-te para o post que acabei de colocar na Sebenta sobre filmes, aquilo que me foi possível dizer àcerca do que "senti", não são críticas, ATENÇÃO!, como prometido. Um abraço,th
Típico...mulher sonhadora, inocente, desviada por um homem mau (como quase todos os que existem...) que se aproveita dela…pois, pois…Deve ser por isso que cada vez há mais mulheres sozinhas…todos os homens se aproveitam delas…são tão inocentes…Tão verdadeiras e puras...Escreves bem, mas tenta ser menos politicamente correcto com as mulheres. Bem sei que o teu auditório é feminina, mas...não exageres tanto
Mas Anónimo, a procissão ainda nem chegou ao adro.
Sugestão: há umas quantas personagens femininas nos outros textos; depois diz-me qualquer coisa.
Caro Rui. é claro que é típico deitar uma olhada, ler e mandar uma boca. Goste-se,deteste-se ou inveje-se!Não vou continuar os meus comentários, fraccionados como colocas os teus posts. Vou espreitando e assumindo. Gosto, e chega.Aguardo que me digas quando em escaparate poderei encontrar este diário desta tua viajem. Um abraço
Combinado, farei isso!
1 Abraço
Que texto bonito,linda vai ser esta história..
Gosto muito. Obrigada pela visita.
Bj
A estória promete!!!
Beijinho
os olhos, o sorriso.... e a farda!
LLOLLLLLLL
Os lisboetas sempre tiveram uma fama de malandrecos que não era brinquedo... Resta saber os que tiveram o proveito...
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